SJ repudia ofensas a árbitros de futebol

O Sindicato dos Jornalistas (SJ) reconhece que a Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF) tem razões para estar indignada com as repetidas ofensas aos seus associados por parte de alguns órgãos de comunicação social.

Respondendo a uma solicitação da APAF, o SJ apreciou um “conjunto de títulos, comentários e rubricas jornalísticas” que os profissionais daquela organização consideram ofensivos, tendo concluído pela existência de comportamentos que nada dignificam a profissão, afirma-se num comunicado divulgado hoje, 17 de Fevereiro.

Na sua tomada de posição, subscrita pela Direcção e pelo Conselho Deontológico, o SJ lembra que “já deixou publicamente bem claro que estará incondicionalmente na defesa do jornalismo corajoso e responsável”, mas que “jamais se cumpliciará com a cobardia dos ataques a pessoas frequentemente impossibilitadas de defender-se” e que “muito menos se cumpliciará com a instigação ou a apologia da difamação ou da arruaça”.

O documento do SJ apela ainda a todos os jornalistas “para que contribuam para a erradicação de comportamentos que lesam a seriedade do jornalismo e corroem os alicerces da credibilidade das suas próprias publicações”.

É o seguinte o texto, na íntegra, do comunicado do SJ:

Arbitragens de futebol e responsabilidade jornalística

A Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF) solicitou ao Sindicato dos Jornalistas (SJ) uma apreciação a um conjunto de títulos, comentários e rubricas jornalísticas, todos eles considerados desprimorosos, se não ofensa grave, para aqueles profissionais, nuns casos individualizados, noutros genericamente atingidos.

Alguns exemplos enviados pela APAF justificam uma reflexão pública por parte do SJ:

1. Numa das peças, e em referência a árbitros, lê-se que “salvo duas ou três excepções, são sempre os mesmo 26, medíocres, influenciáveis e malformados”.

O Sindicato dos Jornalistas recorda que, há alguns anos, tomou a defesa da honra dos profissionais do jornalismo quando processou judicialmente o treinador Pal Czernai, por este ter afirmado que «alguns jornalistas recebem dinheiro para escreverem certas notícias». O tribunal deu razão à indignação do SJ e condenou o treinador. Não pode, pois, o mesmo Sindicato deixar de reconhecer razões para indignação da estrutura associativa dos árbitros ao ver seus associados genericamente atingidos nos seus direitos de personalidade.

2. Noutro texto, o seu autor comenta: “Só peço para que, na eventualidade de me cruzar com o árbitro [e indica o nome], tenha todos os meus pertences bem assegurados. É que o risco de desaparecer algo é grande.”

O SJ alerta para o facto de escritos destes serem acrescidamente irresponsáveis, quando é razoável pressupor que nem sempre o público é dado a interpretar subtilezas da ironia e nem sempre tem condições para fazer leituras menos imediatistas do que lhe é presente. De resto, é necessária uma enorme boa-vontade para detectar subtilezas numa graça pesada e de péssimo gosto como esta.

3. Várias vezes aparece titulada, em parangonas, as palavras “roubo” ou “roubo de igreja”, referindo-se à actuação de árbitros. Há mesmo um jornal que instituiu uma rubrica “agarra que é árbitro”, com uma indisfarçável paráfrase que leva a associar “árbitro” com “ladrão”, especialmente quando se convida leitores “fanáticos” (a expressão é do jornal) a acusar árbitros de errarem nas decisões e se explica: “Sim, que nós gostamos pouco de resultados fabricados graças aos erros de quem não joga” (sublinhado do SJ).

Estes comportamentos são indesculpáveis, seja qual for o género jornalístico em que se verificam. Os seus autores não devem esquecer que se movem num território de paixões, pelo que não podem ignorar que estão, objectivamente, a instigar a crimes de difamação, quando não de agressão física de árbitros de futebol.

O SJ já deixou publicamente bem claro que estará incondicionalmente na defesa do jornalismo corajoso e responsável que denuncie o que deve ser denunciado, com provas lealmente obtidas. E que jamais se cumpliciará com a cobardia dos ataques a pessoas frequentemente impossibilitadas de defender-se no momento e no lugar onde são visadas. Muito menos se cumpliciará com a instigação ou a apologia da difamação ou da arruaça.

Há, pois, que redobrar de escrúpulos quando se escreve sobre pessoas que, por razões do seu próprio estatuto, não podem defender-se com as armas com que são atacadas. É o caso dos árbitros de futebol: nem são ouvidos antes do que se publica, nem podem estatutariamente invocar o direito de resposta.

Mandam a lealdade e a honestidade profissional que atribuir intencionalidade a uma decisão eventualmente errada de um árbitro – mesmo que repetida – constitui um claro desrespeito à ética e muito provavelmente um crime.

É evidente que a matéria publicada não tem origem exclusivamente no trabalho de jornalistas profissionais, mas a circunstância de ser produzida também por colaboradores ou mesmo comentadores ocasionais não desculpa os desvios éticos que possam ser atribuídos ao órgão de informação. Nessa conformidade, independentemente das sanções penais que possam recair sobre os seus autores, há um nível de dever deontológico a que os responsáveis editoriais não podem furtar-se.

O SJ, cujos comunicados nem sempre encontram espaço editorial nomeadamente em órgãos de informação passíveis de crítica, apela a todos os jornalistas, qualquer que seja a sua posição hierárquica, para que contribuam para a erradicação de comportamentos que lesam a seriedade do jornalismo e corroem os alicerces da credibilidade das suas próprias publicações.

Sindicato dos Jornalistas, 17 de Fevereiro de 2004

A Direcção

O Conselho Deontológico

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