SJ denuncia ataque às rádios locais

O encerramento de rádios locais e o despedimento de dezenas de trabalhadores, que está a ser levado a cabo pelo Grupo Media Capital, configura uma operação de liquidação das rádios locais, adverte o Sindicato dos Jornalistas (SJ), que exige a pronta intervenção das autoridades competentes.

Em comunicado divulgado hoje, dia 19, o SJ dá conta de um conjunto de casos – envolvendo o Grupo Media Capital e o Grupo Rádio Renascença – que se traduzem na “concentração real de rádios locais” e na sua “transformação em meros repetidores/distribuidores de programação produzida centralizadamente em Lisboa”. A não ser invertida, esta situação levará à “morte de um elevado número de rádios locais”, como de resto advertiu o SJ aquando da discussão da nova Lei da Rádio, aprovada pelo PS, PSD e CDS.

A receita é simples mas condenável, refere o SJ: “primeiro, passa-se a simples repetidores de gira-discos nacionais umas quantas rádios locais, que nasceram e foram autorizadas para satisfazer o direito das populações à informação local e regional, a ter voz própria na rádio e a ver discutidos os seus problemas; depois, despede-se dezenas ou centenas de profissionais, com elevados custos pessoais, familiares e sociais, mas também com sérios prejuízos para as comunidades”.

Considerando que é tempo de “pôr termo a este embuste”, o SJ advoga que o “poder político tem a obrigação moral e deve ter a coragem política de acabar com esta farsa, garantindo que as rádios locais são efectivamente estruturas locais, voltadas para as suas populações, com serviços informativos a elas destinados e reflectindo os seus problemas, anseios e necessidades”.

É o seguinte o texto, na íntegra, do comunicado do SJ:

SJ contra ataques às rádios locais

1. A operação em curso, no Grupo Media Capital, de encerramento de inúmeras rádios locais – próprias ou de antenas alugadas a operadores locais – e de produção centralizada da programação, com o despedimento de três dezenas de trabalhadores, bem como a compra e modificação da programação da Rádio Noar (Viseu) pela Rádio Renascença confirmam a justeza da oposição do Sindicato dos Jornalistas às alterações à Lei da Rádio.
2. A Media Capital, do grupo espanhol Prisa, que tem vindo a comandar os conteúdos de nada menos de 37 ditas rádios locais, através das quais, por controlo directo ou por acordos para a utilização das antenas de operadores, difunde os seus serviços de programas “M80”, “Cidade FM”, “Star FM”, “Smooth FM” e “Vodafone FM”, está a concentrar as emissões a partir de Lisboa e fazer cessar os serviços locais da “M80”, da “Star FM” e da “Cidade FM” em diversas localidades.
3. Por sua vez, o Grupo Rádio Renascença, da Igreja Católica Portuguesa, além de uma vasta rede de emissores afectos ao Canal 1 e à RFM, distribui os seus serviços Rádio SIM e Mega FM através de 27 antenas locais, por acordo com os operadores ou por aquisição, de que é exemplo mais recente a Rádio Noar.
4. Ao pronunciar-se sobre a nova Lei da Rádio (Lei n.º 54/2010, de 24 de Dezembro), o SJ chamou veementemente a atenção para a enorme porta que o Governo e a maioria parlamentar de então, aliás apoiada pelo PSD e pelo CDS, abririam para o gravíssimo risco da concentração real de rádios locais e a sua transformação em meros repetidores/distribuidores de programação produzida centralizadamente em Lisboa, o que se traduziria na morte de um elevado número de rádios locais.
5. O SJ alertou ainda, nessa altura, para o sério prejuízo que a nova legislação comportaria para as populações e também para o consequente despedimento maciço de jornalistas e de outros profissionais. Infelizmente, o SJ tinha razão!
6. Exemplo desses riscos é a aquisição, já ao abrigo da nova lei, da Rádio NOAR, de Viseu, pela Rádio Renascença, autorizada em Novembro pela ERC, que acaba de autorizar a alteração do projecto da rádio (deliberação do passado dia 6), levando ao silenciamento de uma importante rádio local, em violação da própria Lei da Rádio, e afectando a vida profissional de dois jornalistas ao seu serviço.
7. De facto, a deliberação 40/AUT-R/2011, de 22 de Novembro, autorizou a venda da Rádio NOAR à Rádio Renascença e uma deliberação de 6 de Junho passado (ainda não disponível hoje) autoriza a Renascença a alterar o projecto e a denominação do serviço de programas “Rádio NOAR”, quando a Lei estabelece que a cessão só “pode ocorrer dois anos após a modificação do projecto aprovado” e que qualquer modificação só pode ocorrer dois anos após a cessão do serviço de programas.
8. A este caso se junta ainda a recente dupla operação de alteração do serviço e cessão de uma rádio no Minho à Media Capital cuja autorização da ERC viola a lei: no passado dia 16 de Maio, o Conselho Regulador da ERC aprovou por maioria (votos contra de Arons de Carvalho e Rui Gomes) duas deliberações que têm por objecto o mesmo operador – Maisactual, Comunicação e Meios, Lda., de Amares, Braga – e um beneficiário comum – a Media Capital Rádios – deliberações que, de acordo com a nova Lei da Rádio, não podem ser tomadas em simultâneo.
9. A primeira deliberação (10/AUT-R/2012) autoriza a modificação do projecto licenciado à Maisactual no que se refere à alteração da classificação quanto ao serviço de programas “Cidade FM Minho”, de generalista para temático musical. Tomada no mesmo dia, a segunda deliberação (11/AUT-R/2012) autoriza a cessão desse mesmo serviço e respectiva licença a favor da Rádio Comercial, SA, do Grupo Media Capital.
10. Ora, como se viu no caso da Renascença, as autorizações teriam que observar prazos muito precisos, pelo que as duas autorizações, tendo sido decididas no mesmo dia, dinamitaram qualquer garantia legal. E não é só o SJ a sustentá-lo: na sua declaração de voto, o vice-presidente do CR da ERC, Alberto Arons de Carvalho, alega que as deliberações em causa violam as normas da Lei da Rádio relativas aos prazos para a modificação de projecto ou de cessão.
11. A exemplo da “modificação” minhota, na operação em curso de desmantelamento das rádios locais, a Media Capital e os operadores locais transformados em simples senhorios de antenas de radiodifusão estão a usar uma táctica de “reclassificação” das rádios para justificar despedimentos e legitimar a expansão dos seus serviços a partir de Lisboa.
12. O operador “Rádio Clube de Loulé, CRL, que tem dado de aluguer há anos à Media Capital a sua antena, para o serviço Cidade FM, bem como a mão-de-obra de dois jornalistas, está agora a instar os trabalhadores, por intermédio da Media Capital (!), à rescisão dos contratos, com o argumento de que vai passar a rádio temática musical.
13. O SJ entende que se trata de uma receita simples mas condenável: primeiro, passa-se a simples repetidores de gira-discos nacionais umas quantas rádios locais, que nasceram e foram autorizadas para satisfazer o direito das populações à informação local e regional, a ter voz própria na rádio e a ver discutidos os seus problemas; depois, despede-se dezenas ou centenas de profissionais, com elevados custos pessoais, familiares e sociais, mas também com sérios prejuízos para as comunidades.
14. Neste quadro, o poder político tem a obrigação moral e deve ter a coragem política de acabar com esta farsa, garantindo que as rádios locais são efectivamente estruturas locais, voltadas para as suas populações, com serviços informativos a elas destinados e reflectindo os seus problemas, anseios e necessidades.
15. O SJ desafia concretamente a ERC a reflectir sobre as suas deliberações e o Governo e os grupos parlamentares a pôr termo a este gigantesco embuste. Basta!

Lisboa, 19 de Junho de 2012

A Direcção

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