Conclusões do 1º Congresso

Entre as conclusões do 1.º Congresso dos Jornalistas Portugueses destacam-se: o reconhecimento da independência como atributo essencial do jornalista, a necessidade de reforçar os poderes dos conselhos de redacção, a disposição de combater os contratos a prazo, a realização de acções para conferir força legal ao Código Deontológico, a defesa da integração dos cartunistas na classe jornalística.

As conclusões deste I Congresso dos Jornalistas Portugueses são a síntese consensual possível dos debates nas diversas secções.

Mais do que uma aprofundada e exaustiva análise dos problemas que afectam a vida dos jornalistas portugueses, elas constituem um testemunho significativo das múltiplas questões suscitadas em 23 sessões de trabalho, intensamente participadas ao longo de dois dias.

Elas espelham, ainda, o princípio de uma reflexão alargada a toda a classe e a que só agora se pôde dar início.

Não é o nosso grande caderno reivindicativo, mas contém muitos dos objectivos por que temos lutado e linhas de força para novas formas de intervenção.

Porém, acima de tudo, constituem a prova de que os jornalistas portugueses souberam encontrar um espaço de diálogo entre si, um terreno sólido que podem pisar confiantes, na caminhada por uma profissão mais digna, mais respeitada, mais útil para o povo que servem.

QUESTÕES GERAIS SOBRE DIREITO A INFORMACÃO E LIBERDADE DE INFORMAR

O I Congresso dos Jornalistas Portugueses:

– considera a independência como atributo essencial do jornalista no cumprimento do seu dever de informar e indispensável ao direito de todos serem informados;

– propõe aos jornalistas um cuidado especial na utilização da palavra, distinguindo-a enquanto instrumento da informação ou arma da propaganda;

– rejeita todo o tipo de sensacionalismo, condenando o tratamento da informação como mero produto de comércio, opção que nunca é politicamente ingénua;

– recomenda com veemência o prosseguimento do debate sobre a Nova Ordem Internacional da Informação e sobre a dependência informativa em que Portugal ainda se encontra;

– preconiza que o jornalista, veículo da defesa dos valores da Paz e da Vida, deve esclarecer a opinião pública sobre os conceitos universais contra a guerra já aceites na letra de acordos internacionais;

– recomenda também a necessidade da criação de meios alternativos ao controlo da informação internacional por poderosas agências estrangeiras; nesse sentido, considera imprescindível o alargamento da rede de jornalistas portugueses em domínios específicos das relações internacionais;

– defende o acesso da população à informação, sendo necessário apoiar o crescimento quantitativo da informação, nomeadamente através da participação dos jornalistas, nessa qualidade, na gestão estratégica das empresas de informação, em particular no sector público.

EXERCíCIO DO JORNALISMO EM PORTUGAL

O I Congresso dos Jornalistas Portugueses:

– alerta para a dupla necessidade de aperfeiçoar e cumprir com rigor o Código Deontológico bem como de desencadear acções para conferir forca legal a este instrumento de conduta;

– verifica que a conquista da liberdade de imprensa, em 25 de Abril de 1974, fez aumentar o número de jornalistas e também as motivações desta opção profissional, mas a crise do sector tem gerado frustrações e instabilidade de emprego;

– exige o cumprimento da lei no acesso às fontes de informação e defende a melhoria do respectivo enquadramento legal;

– salienta que é no sector público da comunicação social que está localizado o maior espaço de liberdade da informação portuguesa, sendo porém necessário criar mecanismos que impeçam a instrumentalização governamental das empresas públicas;

– entende dever reforçar-se o carácter vinculativo dos pareceres dos Conselhos de Redacção sobre directores e chefias em todos os meios de comunicação social;

– conclui que a tentativa de extinção da Anop foi um acto arbitrário do governo com motivações político-partidárias, e outras localizadas em circuitos informativos internacionais cujo boicote aos países africanos de língua oficial portuguesa estava a ser contrariado pela Agência;

– regozija-se pelo facto de a solidariedade nacional e internacional ter contribuído decisivamente para a derrota da tentativa de extinção da Anop;

– chama a atenção para as redobradas dificuldades com que deparam os jornalistas afastados dos grandes centros urbanos, por forca das tentativas de controlo directo das autoridades locais e pela carência de meios ao seu dispor;

– reclama a eliminação das concepções que têm originado a nomeação e destacamento de chefias e directores oriundos dos grandes centros, com a consequente secundarizacão dos jornalistas locais;

– congratula-se com o progressivo crescimento do ingresso de mulheres na classe às quais deve ser reconhecida igualdade de oportunidades de acesso aos cargos de direcção e chefia;

– recomenda que se promova o debate sobre a problemática da mulher jornalista e da utilização da imagem da mulher na informação como factor de sensacionalismo;

– considera que a classe não pode continuar a aceitar no seu seio aqueles que emprestam a sua pena, a sua voz e até a sua imagem à publicidade de produtos ou empresas.

QUESTÕES SOCIO-PROFISSIONAIS

O I Congresso dos Jornalistas Portugueses:

– adverte a classe para a necessidade de melhorar a qualidade da informação produzida em Portugal; para tanto, é imperativo elevar o nível cultural e de remuneração dos jornalistas, respeitar os princípios deontológicos e as regras profissionais, bem como recusar, com firmeza, a interferência dos poderes político e económico que pretendem – e tantas vezes o conseguem – transformar a informação em simples caixa de ressonância de objectivos propagandísticos;

– recomenda que não se permita que a mediocridade encontre refúgio no actual sistema de carreiras e na atribuição de carteiras profissionais; impõe-se pois uma reflexão dos jornalistas sobre o papel presente e futuro dos Conselhos de Redacção, designadamente em todas as formas de acesso à profissão;

– considera ser a altura de dar por finda a fase da tarimba como meio de formação profissional: o avanço tecnológico, a complexidade das fontes de informação e a necessidade da compreensão da realidade social reclamam uma preparação base, teórica e prática, em escolas que, podendo não ser obrigatoriamente universitárias, aproximem os alunos e os jornalistas profissionais;

– sublinha ser indispensável a criação de estruturas tecnicamente apetrechadas para a imprensa, rádio e televisão, que forneçam a formação permanente e a reciclagem fundamentais na dignificação da classe;

– apoia a especialização profissional como forma de melhorar a qualidade da informação;

– afirma a necessidade de combater o recurso sistemático das empresas a colaboradores, factor restritivo do acesso de candidatos à profissão e de jornalistas profissionais a postos de trabalho;

– sugere a luta no sentido de que as empresas se obriguem a admitir anualmente um determinado número de diplomados em comunicação social ou jornalismo, cujo trabalho será apreciado pelos Conselhos de Redacção;

– apela para que se abram mais amplamente as portas de próximos congressos de jornalistas a estudantes e professores desta matéria;

– reafirma a disposição da classe de combater firmemente os contratos a prazo e outras formas mais ou menos camufladas de exploração de jornalistas, nomeadamente as que exigem a prestação de serviços incompatíveis com as funções profissionais legalmente definidas;

– considera que, no domínio da cooperação com os países de língua oficial portuguesa, a formação profissional dos quadros tem de deixar de ser um mito: as declarações de boa vontade multiplicam-se, mas o suporte financeiro não as acompanha, tornando-se importante diversificar as formas de entreajuda não apenas no plano governamental como a nível sindical;

– aponta para a urgência de uma batalha contra a situação altamente degradada das condições de segurança social dos jornalistas portugueses, quer relativamente a outros países, quer mesmo em comparação com outras profissões no quadro da nossa sociedade.

FORMAS ESPECÍFICAS DE JORNALISMO

O I Congresso dos Jornalistas Portugueses:

– defende que há que mudar radicalmente o teor e o estilo da informação na rádio;

– salienta que é igualmente urgente acabar, na informação televisiva e radiofónica, com situações anómalas e ilegítimas como a censura por acção ou omissão, a ausência de pluralismo, as limitações à intervenção colectiva dos jornalistas, actos administrativos que ferem um desejável clima de unidade profissional em meios de comunicação tão poderosos como a RTP e a RDP;

– considera ser preciso dar voz, imagem e espaço, à informação regional: a rádio, a televisão e os jornais de grande circulação não podem limitar-se ao triângulo S. Bento/Belém/Gomes Teixeira e à realidade lisboeta;

– denuncia a marginalização da informação regional, sem esquecer a que se destina aos emigrantes, confinada a escassas rubricas especiais na rádio e na televisão;

– apoia a realização de um encontro nacional da imprensa regional, apontando a Vila do Fundão como local possível;

– reconhece o mérito da informação regional que reflecte os problemas locais e sublinha a necessidade da concretização dos apoios, tantas vezes prometidos e tão raramente cumpridos;

– sustenta que deve aumentar-se o espaço de informação para a cultura e que os jornalistas especializados neste domínio se mobilizem para a realização de um encontro nacional;

– sublinha a importância do fenómeno desportivo como fenómeno cultural, pelo que a expansão do jornalismo desportivo deverá ser acompanhada pelo aumento do espaço de informação cultural, de uma forma regular e eficaz;

– salienta a importância dos centros de documentação nos órgãos de informação e o carácter jornalístico do trabalho que ali se desenvolve;

– propõe a criação de um grupo de trabalho que integre representantes do Sindicato e dos desenhadores de imprensa (caricaturistas) no sentido de se obter o explícito reconhecimento legal destes profissionais como jornalistas e o seu enquadramento na classe;

– realça a necessidade da criação do cargo e do estatuto de editor fotográfico, ao mesmo nível dos quadros de chefia de Redacção dos jornais, como primeiro e fundamental passo para o reconhecimento efectivo da qualidade de jornalistas aos repórteres fotográficos;

– verifica o interesse em aprofundar o debate sobre o enquadramento da imprensa sindical e da imprensa partidária;

– discutiu ainda o trabalho profissional em gabinetes de imprensa e nos jornais de empresa, concluindo ser necessário voltar a reflectir sobre questões de natureza deontológica e sindical, entre outras, que tais actividades suscitam.

Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 22 de Janeiro de 1983.

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