Apreciação do SJ sobre regulamentação de estágios profissionais

O Sindicato dos Jornalistas (SJ) considera que os estágios profissionais dos jornalistas devem ficar de fora do Projecto de decreto-lei que estabelece as regras para a realização de estágios profissionais, actualmente em apreciação pública. O parecer foi entregue hoje no Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social.

No documento, que a seguir se reproduz na íntegra, o SJ manifesta a sua discordância com o facto de o diploma consagrar a realização dos estágios “à margem de uma relação de trabalho subordinado, ficando submetidos a um denominado contrato de estágio, cujo vínculo obrigacional não se confunde com o que emerge do contrato de trabalho”.

O SJ não aceita esta opção, e faz notar que o “regime de estágio na profissão de jornalista, estatuído legal e convencionalmente, representa um compromisso há muito sedimentado entre os parceiros sociais do sector e o Estado, na medida em que ele é entendido como a melhor via para formar adequadamente os jornalistas e para garantir os direitos dos cidadãos, regime esse que, por todas as razões, deve ser mantido”.

Assim, o Sindicato dos Jornalistas entende que o diploma que venha resultar da presente iniciativa legislativa deve excluir expressamente do seu âmbito o estágio profissional do jornalista, e advoga que o mesmo deve permanecer “sujeito ao disposto no estatuto legal da profissão e respectiva regulamentação, bem como nas convenções colectivas aplicáveis”.

Apreciação ao projecto de decreto-lei que estabelece as regras a que deve obedecer a realização de estágios profissionais

1. O artº 1º do Projecto esclarece que o diploma resultante desta iniciativa legislativa destina-se a estabelecer as regras a que deve obedecer a realização de estágios profissionais, incluindo os que tenham como objectivo a aquisição de uma habilitação profissional legalmente exigível para o acesso ao exercício de determinada profissão.

2. Segundo o artº 3º do mesmo Projecto, a realização do estágio fica submetida à celebração de um contrato de estágio, reduzido a escrito, determinando a data de início e de cessação, as funções ou tarefas atribuídas ao estagiário, o local e a duração do período diário e semanal das actividades, bem como o valor dos subsídios de estágio e de refeição.

3. O contrato de estágio tem a duração de 12 meses que pode ir até aos 18 meses nos casos de estágio obrigatório para aquisição de habilitação profissional legalmente exigível para o acesso a uma profissão.

4. O Artigo 12º do Projecto fixa a prevalência do regime nele contido, determinando que as suas normas prevalecem sobre quaisquer outros diplomas legais ou regulamentares, excepto nas situações que o artº 1º expressamente ressalva e que são os seguintes:

– estágios curriculares;

– estágios profissionais extracurriculares objecto de comparticipação pública;

– estágios profissionais regulados pelos DL nº 18/2010, de 18 de Março e nº 65/2010, de 11 de Junho (programa de estágios para jovens licenciados em serviços da Administração Pública central e local);

– estágios, cuja realização seja obrigatória para o ingresso ou acesso a uma carreira ou categoria no âmbito de relação jurídica de emprego público;

– estágios que correspondam a trabalho independente.

5. Ora, decorre do Projecto que os estágios abrangidos são realizados à margem de uma relação de trabalho subordinado, ficando submetidos a um denominado contrato de estágio, cujo vínculo obrigacional não se confunde com o que emerge do contrato de trabalho.

6. Neste contexto, coloca-se a dúvida de saber se a vontade do legislador vai ou não no sentido de, tendo em conta a mencionada prevalência, submeter às novas regras os estágios profissionais, que hoje se efectuam, por imperativo legal, em contexto de contrato de trabalho.

7. Sucede que o estágio profissional do jornalista é um dos casos em que a lei manda que se realize numa situação de trabalho subordinado.

Com efeito,

8.Correspondendo à necessidade de salvaguardar as garantias dos cidadãos e a adequada apreensão da leges artis da profissão de jornalista, dentro dum contexto peculiar, houve que estabelecer condições muito específicas de acesso que estão, há muitos anos, expressamente reguladas na lei e nas convenções colectivas de trabalho aplicáveis ao sector.

9. Uma dessas condições específicas é o facto de o estágio profissional obrigatório constituir, desde logo, a primeira etapa da profissão e, em consequência, e ser realizado no âmbito de um contrato de trabalho, pois o jornalista celebra o contrato de trabalho para exercer a profissão, sabendo que tem, como primeira etapa, a realização do respectivo estágio.

10. A profissão de jornalista está submetida a um Estatuto Profissional aprovado por lei da Assembleia da República, estando em vigor o que foi aprovado pela Lei nº 1/99, de 13 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 64/2007, de 6 de Novembro e regulado pelo Decreto-Lei nº 70/2008, de 15 de Abril e pelas Portarias nº 318/99, de 12 de Maio, nº 360/99, de 19 de Maio e nº 480/99, de 30 de Junho.

11. Segundo esse Estatuto (artº 5º), a profissão de jornalista inicia-se com um estágio obrigatório (cujo tempo é contado para a antiguidade profissional), a concluir com aproveitamento, com a duração de 12 meses, em caso de licenciatura na área de comunicação social, ou de 18 meses nos restantes casos, sendo o seu regime, incluindo o acompanhamento do estagiário e a respectiva avaliação, regulado por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pela áreas do emprego e da comunicação social (actualmente a Portaria nº 318/99).

12. Este estágio e o nome do respectivo orientador é obrigatoriamente comunicado pelo Director do órgão de Informação à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, entidade emissora do título profissional (título de estagiário e carteira profissional), documento indispensável para o exercício da profissão.

13. Também o artº 6º do já mencionado Decreto-Lei nº 70/2008 refere que a profissão de jornalista inicia-se com um estágio a realizar em regime de ocupação principal, permanente e remunerada.

14. Este mesmo preceito adianta que o jornalista estagiário deve requerer à referida Comissão, nos primeiros 30 dias de estágio, um título de estagiário, documento bastante para o exercício da actividade, para o que apresentará entre outros elementos, declaração comprovativa da admissão como estagiário da redacção, assinada pelo respectivo director, com indicação do jornalista responsável pela orientação do estágio e ainda documento comprovativo do exercício da profissão, com indicação das funções, emitida pela entidade empregadora.

15. Só munido do referido título é que o estagiário pode realizar os actos profissionais indispensáveis a uma adequada aprendizagem.

16. Após a conclusão do estágio com aproveitamento, a Comissão emite a carteira profissional, devendo o jornalista requerente apresentar, entre outros documentos, declaração que ateste a realização do estágio com aproveitamento e declaração comprovativa do exercício da profissão em regime de ocupação principal, permanente e remunerada, com indicação da categoria e das funções desempenhadas emitida pela entidade empregadora.

17. Também as convenções colectivas de trabalho do sector prevêem a existência de um estágio profissional, procedem à respectiva regulamentação e fixam mesmo a retribuição mensal a auferir pelo estagiário (cf., a título de exemplo, a Cláusula 6ª e o nº 5 do Anexo I do CCT celebrado entre este Sindicato e a Associação Portuguesa de Imprensa, publicado no BTE nº 27, de 22/7/2010).

18. O regime de estágio na profissão de jornalista, estatuído legal e convencionalmente, representa um compromisso há muito sedimentado entre os parceiros sociais do sector e o Estado, na medida em que ele é entendido como a melhor via para formar adequadamente os jornalistas e para garantir os direitos dos cidadãos, regime esse que, por todas as razões, deve ser mantido.

19. Nessa medida, o Sindicato dos Jornalistas entende que o diploma que venha resultar da presente iniciativa legislativa deve excluir expressamente do seu âmbito o estágio profissional do jornalista.

20. Assim, propõe-se que seja acrescentado um número 4 ao artigo 1º do Projecto com a seguinte redacção:

4. Fica ainda excluído do âmbito do presente diploma o estágio profissional do jornalista que permanece sujeito ao disposto no estatuto legal da profissão e respectiva regulamentação, bem como nas convenções colectivas aplicáveis.

Lisboa, 23 de Fevereiro de 2011

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