Alta Autoridade adverte Nacional da Madeira

Na sequência de uma queixa do Sindicato dos Jornalistas contra o Clube Desportivo Nacional da Madeira, a Alta Autoridade para a Comunicação Social (AACS) deliberou advertir o clube para a obrigação de “assegurar o acesso à informação, sem discriminações, a qualquer jornalista devidamente identificado de qualquer órgão de comunicação social”.

A deliberação alerta ainda o Clube Desportivo Nacional (CDN) da Madeira para a necessidade de garantir que o acesso à informação se faça “em condições de segurança que previnam quaisquer agressões, verbais ou físicas, a qualquer representante de órgão da comunicação social, no exercício legítimo da sua actividade profissional.”

A queixa do SJ reportava-se a alegadas agressões contra um jornalista da RDP Madeira durante um jogo entre o CDN e o Alverca, seguidas de ordem de expulsão do mesmo jornalista da conferência de imprensa promovida pelo clube no final do jogo, no dia 4 de Junho de 2004, por parte de um dirigente do CDN.

É o seguinte o texto, na íntegra, da deliberação da AACS:

DELIBERAÇÃO RELATIVA A QUEIXA DO SINDICATO DOS JORNALISTAS CONTRA O CLUBE DESPORTIVO NACIONAL DA MADEIRA POR ALEGADA VIOLAÇÃO DO DIREITO À INFORMAÇÃO

(Aprovada em Reunião Plenária de 1 de Junho de 2005)

I – A QUEIXA

1.1. Do Sindicato dos Jornalistas foi recebida participação contra o Clube Desportivo Nacional da Madeira por alegada “ grave violação do direito à informação comunicada pela Direcção do Clube Desportivo Nacional no dia 4 de Janeiro”.

1.2. Acompanhada de recortes de 3 jornais que davam conta de alegadas agressões ocorridas a um jornalista da RDP Madeira durante um jogo entre o referido Clube da Madeira e o Alverca, seguidas de ordem de expulsão do mesmo jornalista da conferência de imprensa, por parte de um dirigente do CDN, o Sindicato de Jornalístas juntou “Comunicado” da sua Direcção Regional da Madeira, no qual, em síntese, se denunciam e condenam “veemente as agressões físicas e verbais de que foi alvo, ontem à tarde, o repórter de informação da RDP/Madeira que estava de serviço no estádio Eng. Rui Alves durante o encontro entre o Clube Desportivo Nacional e o Alverca.”

1.3. No mencionado Comunicado acrescenta-se ainda que

– alguns dirigentes do CDN teriam “incentivado os seus adeptos à violência física e verbal contra o referido repórter, num gesto de violação da liberdade de imprensa e do estatuto do jornalista e de incentivo à prática de um crime”;

– “todos os jornalistas presentes na sala de imprensa do estádio Eng. Rui Alves, ao serem confrontados com a ordem de expulsão da sala do repórter da RDP/Madeira por um dirigente do Nacional, tomaram, em conjunto, a atitude digna e solidária de abandonar a respectiva conferência de imprensa.”

II. O CONTRADITÓRIO

2.1. Solicitado ao Clube Desportivo Nacional da Madeira que se pronunciasse, querendo, sobre o teor da participação, veio o mesmo, após referir não estar obrigado a fazê-lo, informar “de livre e expontânea vontade”, que:

a) “A queixa realizada pelo Sindicato dos Jornalistas a 13 de Janeiro de 2004 está completamente distorcida da realidade, pois em tempo ou situação alguma o Clube Desportivo Nacional, ou algum seu Dirigente, violou o direito à informação, conforme vem referido no ofício do sindicato dos Jornalistas a esse Órgão.

b) Ao contrário, verdade seria antes que “durante a realização do jogo em epígrafe foram proferidas algumas palavras e divulgadas determinadas notícias por um jornalista da RDP sem qualquer aproximação da realidade, que em nada dignificam a imagem do Clube Desportivo Nacional e consequentemente dos seus dirigentes, do futebol profissional e das instituições que este envolve”.

c) Teria sido “inclusivamente a estrutura profissional do Clube Desportivo Nacional a tomar providências com o contigente da PSP e Steward presentes no Estádio para que o referido profissional de rádio, pudesse chegar à sala de imprensa ileso, pois os ânimos dos adeptos deste Clube estavam exaltados com a falsidade do divulgado numa rádio com audiência nacional”.

d) Não existiram “queixas ou participações à PSP, exames ou relatórios clínicos, nem o relatório da PSP dá conta de agressões físicas, o mesmo acontecendo com o relatório do Delegado da LPFP.”

e) “É completamente mentira que os Dirigentes do Clube Desportivo Nacional tenham incentivado os seus adeptos à violência física e verbal contra o referido repórter de informação, assim como é igualmente mentira que este Clube ou algum seu Dirigente tenha dado ordem de expulsão ao repórter da RDP/Madeira (conforme referido no Comunicado do Sindicato dos Jornalistas).”

f) Teria alertado, “através do seu Director de Segurança, o Delegado da Liga PFP que não proferiria quaisquer declarações – o que lhe é permitido fazer pois ninguém está, nem poderia estar obrigado a declarar seja o que for – se o repórter da RDP/Madeira estivesse na sala de imprensa; contudo, não expulsou ninguém daquela sla. Assim o fez, igualmente, o Vice Presidente da Direcção deste Clube, Gris Teixeira, quando falou com os jornalistas que aguardavam a conferência de imprensa, tendo estes abandonado livremente aquela sala.”

2.2. O CDN junta, ainda, à sua missiva carta do Director da RDP Madeira em que este “lamenta o incidente ocorrido” considerando “extemporâneo o comentário do (seu) colaborador” entendendo “que o (seu) repórter deveria ter confirmado junto da Direcção do CDN a situação descrita no órgão de informação” e acaba solicitando que “este incidente infeliz não (seja) motivo para a não continuidade do bom relacionamento existente entre a RDP e o CDN” e pedindo ao CDN que “para os próximos jogos”, garanta “condições de segurança para que a (sua) equipa de reportagem possa desenvolver o seu trabalho sem incidentes que ponham em causa a sua integridade física”.

2.3. Em face do teor desta informação, que contraria fundamentalmente, no essencial, o teor da participação do Sindicato dos Jornalistas insistiu-se, por diversas vezes, com o mencionado organismo para que produzisse uma “posição fundamentada sobre as alegações agora produzidas, (pelo CDN) nos aspectos de facto”, sugerindo-se mesmo a “junção de prova documental ou audiovisual ou relatos de testemunhas presenciais ou do próprio visado”

Estas insistências foram efectuadas por ofícios de 9 de Fevereiro, 28 de Junho, 7 de Setembro e 20 de Dezembro.

O Sindicato dos Jornalistas não lhes deu qualquer resposta, até hoje.

III – APRECIAÇÃO DA SITUAÇÃO

3.1. Dos relatos e elementos juntos parece poder concluir-se com certeza a ocorrência dos seguintes factos:

a) Um repórter da RDP Madeira ter-se-à feito eco de notícias, não confirmadas, publicadas em alguns periódicos locais, sobre o alegado atraso no pagamento de ordenados “no seio do plantel dos alvinegros”

b) Quando o mesmo repórter se apresentou no estádio da Choupana, terá sido alvo de insultos, injúrias e ameaças de agressões.

c) O que terá levado à necessidade de ser objecto de especial protecção e escolta policial.

d) Na sala de imprensa um dirigente do CDN, vice-presidente do Clube, ter-se-à recusado a prestar declarações enquanto o referido repórter aí se mantivesse.

e) Todos os jornalistas presentes “por solidariedade com o colega de profissão” decidiram retirar-se da sala.

3.2. Em contrapartida não se pode asseverar que

– o jornalista em causa tenha sido objecto de agressão física

– algum ou alguns dirigentes do CDN tenham incentivado os seus adeptos à violência física e verbal contra o referido repórter

3.3. Os factos assentes permitem concluir que dirigente do CDN, como retaliação a afirmações produzidas pelo repórter da RDP/Madeira relativamente a notícias não confirmadas sobre alegados atrasos no pagamento de ordenados, se teria recusado a prestar quaisquer declarações na sua presença, no final do jogo CDN-Alverca, tendo exigido mesmo a sua saída da sala de imprensa.

3.4. Estes factos, só por si, configuram a violação do direito dos jornalistas de acederem à informação, sem discriminações, previsto no artigo 38º nº2 al. b) da Constituição, no artigo 1º nº2, no artigo 2º nº1 al. a) e no artigo 22º al. b) da Lei de Imprensa e no artigo 9º e 10º do Estatuto do Jornalistas e pode mesmo revestir moldura penal, nos termos do artigo 19º do mesmo Estatuto, aspecto que não cabe nas competências desta AACS apreciar.

IV – CONCLUSÃO

Tendo apreciado a denúncia do Sindicato dos Jornalistas contra o Clube Desportivo Nacional da Madeira relativamente a factos que envolveram a participação de repórter da RDP Madeira em conferência de imprensa promovida pelo referido Clube no final do jogo CDN/Alverca do dia 4 de Junho de 2004, a Alta Autoridade para a Comunicação Social deliberou advertir o referido Clube para a obrigação de assegurar o acesso à informação, sem discriminações, a qualquer jornalista devidamente identificado de qualquer órgão de comunicação social, independentemente das opiniões do mesmo e para a necessidade de garantir que esse acesso se faça em condições de segurança que previnam quaisquer agressões, verbais ou físicas, a qualquer representante de órgão da comunicação social, no exercício legítimo da sua actividade profissional.

Esta deliberação foi aprovada por unanimidade com votos de Jorge Pegado Liz (relator), Armando Torres Paulo, Sebastião Lima Rego, José Garibaldi, João Amaral, Manuela Matos, Maria de Lurdes Monteiro, Carlos Veiga Pereira e José Manuel Mendes.

Alta Autoridade para a Comunicação Social, em 1 de Junho de 2005

O Presidente

Armando Torres Paulo

Juiz-Conselheiro

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