2º Congresso dos Jornalistas Portugueses – Deontologia – 1986

O II Congresso dos Jornalistas Portugueses reuniu-se entre 12 e 15 de Novembro de 1986, na Fundação Calouste Gulbenkian, para discutir o tema Deontologia.

Durante quatro dias, mais de cinco centenas de jornalistas e mais de uma centena de alunos e professores de faculdades e escolas superiores de Jornalismo reflectiram sobre os deveres profissionais dos jornalistas.

Os trabalhos traduziram-se na aprovação de uma resolução, que sintetizou os debates realizados em sessões plenárias. Reproduz-se aqui a Resolução do Congresso, assim como o seu Relatório-síntese. Reproduzimos também o índice do livro editado pelo Secretariado da Comissão Executiva do Congresso, no qual foram apresentadas mais de 60 teses.

Resolução do 2º Congresso

A Resolução aprovada no final do 2.º Congresso dos Jornalistas defendeu a criação de um novo Código Deontológico, determinando no entanto que o mesmo «só deverá prever sanções de natureza moral, cuja aplicação será confiada a um Conselho Deontológico eleito por todos os jornalistas». Foram ainda exaradas recomendações em matéria de acesso à profissão e quanto à carteira profissional.

1. Os jornalistas portugueses, reunidos em Congresso, consideram imprescindível rever profundamente o actual quadro deontológico. A experiência de doze anos de liberdade e dez de Código Deontológico demonstrou que a seriedade e credibilidade do jornalismo português têm sido afectadas por incorrectas, ambíguas e ineficientes disposições deontológicas.

A revisão do actual quadro deontológico visa formular com rigor princípios éticos imprescindíveis ao exercício da profissão, reforçar o seu grau de consensualidade e garantir a sua eficácia, dotando-os de mecanismos de legitimidade inequívoca.

Desta forma, os jornalistas portugueses assumem exemplarmente o desafio de clarificar as suas próprias regras de responsabilização profissional perante a opinião pública e os poderes instituídos, e não cedem à facilidade de condicionar essa exigência à resolução dos graves problemas sociolaborais de que também são vítimas.

Neste sentido, o II Congresso dos Jornalistas Portugueses considera que a responsabilidade social e a expressão pública do exercício do jornalismo exigem um Código Deontológico.

Será um código de honra e conduta profissional que exprima em normas consensuais os valores éticos com incidência na profissão. Constituirá igualmente um compromisso dos jornalistas perante a opinião pública.

Documento de referência para todos os jornalistas, o Código deverá ser discutido e aprovado, em igualdade de circunstâncias, por todos os detentores de título profissional.

Um compromisso de honra deste tipo limitar-se-á a enunciar com clareza os deveres, deixando para o âmbito das leis o estabelecimento dos direitos e incompatibilidades profissionais.

Admite-se que o Código Deontológico seja aprovado em simultâneo com uma proclamação que contenha os direitos fundamentais para o exercício da profissão, os quais vinculam o jornalista à obrigação moral de não abdicar deles.

Esta proclamação integraria ainda as linhas gerais dos Princípios Internacionais da Deontologia dos Jornalistas, aprovados em 1983.

O Código só deverá prever sanções de natureza moral, cuja aplicação será confiada a um Conselho Deontológico, eleito por todos os jornalistas. Esse Conselho deverá também pronunciar-se publicamente sempre que a actuação de um órgão de Informação se caracterize pela violação de preceitos do Código.

2. O II Congresso dos Jornalistas Portugueses analisou ainda as questões relativas ao exercício da profissão, nomeadamente no que respeita à atribuição, revalidação, suspensão e cassação da Carteira, bem como às incompatibilidades.

Sobre esta matéria:

– recomenda ao Sindicato dos Jornalistas que promova as iniciativas tendentes à modificação das leis actuais no sentido de uma definição mais rigorosa das incompatibilidades e dos tempos mínimos da sua duração;

– considera que a atribuição, revalidação, suspensão e cassação do título profissional deve caber a uma instância no âmbito do Conselho de Imprensa, o qual deverá adequar a sua composição e esta nova competência; na referida instância, pelo menos metade dos seus membros serão jornalistas indicados pelo Sindicato;

– recomenda ainda ao Sindicato dos Jornalistas que desenvolva acções junto das instâncias legislativas no sentido de que o acesso à profissão e ao estágio deixe de depender de um vínculo contratual; em contrapartida, a atribuição da Carteira Profissional deve obedecer a uma rigorosa análise das condições em que decorreu o estágio e dos seus resultados profissionais; essa apreciação deverá ser feita por uma comissão de jornalistas sob a égide do Conselho de Imprensa.

Relatório-síntese do 2º Congresso

Além da resolução que consubstanciou as conclusões do 2.º Congresso dos Jornalistas Portugueses, foi elaborado um Relatório-síntese dos debates, no qual foram abordados outros assuntos directa ou indirectamente relacionados com o tema «Deontologia», a fim de servirem de base à pretendida reformulação do Código Deontológico dos Jornalistas e para futuras acções do SJ.

O II Congresso dos Jornalistas Portugueses, reunido entre 12 e 15 de Novembro de 1986 para discutir o tema Deontologia, evidenciou a importância que esta questão reveste actualmente para o jornalismo e os jornalistas em Portugal.

As conclusões saídas das comunicações e debates realizados em sessões plenárias sintetizam-se numa resolução final.

Para além dessas conclusões, o Congresso abordou outros assuntos, directos ou indirectamente relacionados com a deontologia, entre os quais se destacam os seguintes:

– evolução histórica dos códigos deontológicos a nível internacional e os esforços dos jornalistas portugueses para a concretização de um código deontológico;

– a formação profissional e cultural como condição essencial à competência e a uma verdadeira consciência deontológica; concretamente, foram apresentadas as seguintes recomendações: criação de condições para períodos de estudo e actualização profissional, aperfeiçoamento dos cursos de Jornalismo e Comunicação, com crescentes garantias de acesso à profissão e, mais especificamente, a introdução nos curricula desses cursos de novas disciplinas, tais como Direito Internacional, Fotografia, etc., no âmbito da formação profissional devem ser abertas opções para especialização, entre elas a do fotojornalismo.

– respeito pelas fontes de informação, que em regra devem ser citadas para sua responsabilização, salvo as situações justificáveis pelo sigilo profissional;

– o contacto frequente com fontes ligadas aos poderes político e económico não pode conduzir a uma informação manipulada, cujo rigor a independência tais fontes tentam, muitas vezes, pôr em causa; do mesmo modo, haverá que guardar o maior rigor deontológico perante grupos de pressão, entre os quais se podem incluir, até, clubes desportivos;

– o direito dos cidadãos a serem informados implica a responsabilidade social do jornalista, portanto o dever, entre outros, de produzir uma informação honesta, completa, verdadeira, não viciada;

– as insuficientes condições de remuneração e segurança no emprego, entre outras deficiências no exercício da actividade profissional, colocam dificuldades reais ao cumprimento de normas deontológicas, mas não podem justificar o seu incumprimento;

– a incompatibilidade do exercício do jornalismo com actividades nos domínios da publicidade e das relações públicas foi discutida e de novo reafirmada;

– a deontologia profissional é ainda profundamente afectada quando os critérios profissionais são preferidos em favor de outros de carácter político ou pessoal;

– os conselhos de redacção devem ser mais intervenientes e eficazes na defesa dos princípios e das práticas deontológicas;

– todas as formas de sensacionalismo devem ser recusadas;

– a introdução de novas tecnologias não pode transformar os jornalistas em meros “técnicos de informação”, alheios ao conteúdo do que produzem;

– o conhecimento das realidades internacionais deve ser preferentemente obtido através da criação e funcionamento de uma estrutura informativa nacional no estrangeiro, com delegações e correspondentes profissionais portugueses dotados das respectivas acreditações e condições de trabalho, evitando-se a dependência sistemática dos grandes monopólios internacionais da informação. Recomenda-se ainda ao Sindicato dos Jornalistas que na negociação de convenções colectivas sejam incluídas as condições indispensáveis à actuação dos correspondentes profissionais no estrangeiro;

– a governamentalização da rádio e televisão públicas constitui um dos mais sérios condicionantes do exercício profissional nestes meios de comunicação e uma afronta ao direito dos cidadãos a serem informados.

Índice

RESOLUÇÃO E RELATÓRIO-SÍNTESE DOS DEBATES

7 – Resolução

9 – Relatório – síntese dos debates

SESSÃO DE ABERTURA

13 – Intervenção em nome da Comissão Organizadora – Adelino Gomes

19 – Intervenção em nome do Sindicato dos Jornalistas – José Pedro Castanheira

22 – Discurso do Presidente da República, Dr. Mário Soares

INTERVENÇÕES DOS REPRESENTANTES DE ORGANIZAÇÕES ESTRANGEIRAS

29 – Federação Internacional dos Jornalistas – Raimundo Garcia

33 – Organização Internacional dos Jornalistas – Gerard Gatinot

36 – Mensagem do director-geral para a Cultura e Comunicação da Unesco, Henri Lopes

38 – Jornalistas de Cabo Verde – Alfredo Carvalho Santos

40 – Jornalistas da Guiné-Bissau – José Rodrigues Santy

42 – Jornalistas de S. Tomé – Carlos Alberto Teixeira D´Alva

44 – Organização Nacional dos Jornalistas Moçambicanos – Leite de Vasconcelos

48 – União dos Jornalistas Árabes – Aouad Abdellatif

49 – Jornalistas chineses de Macau – Thomas Lou

TESES

I — Deontologia: Abordagem genérica do problema

55 – As novas tecnologias, a indústria da comunicação e a deontologia – Miguel Urbano Rodrigues

62 – A responsabilidade social do jornalista – Fernando Correia

67 – Solidariedade social, solidariedade de classe – João Ogando

70 – Comunicação e política – Costa Carvalho

73 – Em nome da nossa deontologia (Manifesto ao Congresso) -Arsénio Mota

75 – A deontologia da libertação – Moutinho Pereira

78 – A honra do Convento – Carlos Magno

80 – O novo jornalismo – Manuel Abranches de Soveral

82 – Deontologia: poder económico, político e cultural – João Telmo de Araújo

86 – Os horizontes do Bairro Alto – Joaquim Vieira

92 – A deontologia paga-se – Pedro Garcia Rosado

II — Deontologia: Modos de exercício da profissão e práticas profissionais

97 – Aspectos deontológicos e políticos duma informação local – Avelino Rodrigues, Fátima Cid e Vítor Pereira

103 – A informação, os jornalistas e a deontologia em Macau – César Camacho

109 – Não há jornalistas em tecnicolor – uma experiência profissional na América – Filipe Vieira e Manuel Lage

113 – Cobertura e acontecimentos do III Mundo – reportagens ou interpretação? – António de Figueiredo

117 – Rebentou a guerra…segundo as agências – Jorge Ribeiro

135 – Günter Wallraff: um jornalista incómodo – Carlos Martins, José Belchior e Jorge Pereira

140 – A deontologia e a formação profissional – Manuel Pinto

143 – A fotografia, o fotógrafo-jornalista e a missão de fotografar notícias – Luís Manuel Vasconcelos

146 – Desporto-jornalismo: deontologia? Sim, obrigado! Eduardo Miragaia

150 – Perspectivas deontológicas para um jornalismo parlamentar – Oliveira Figueiredo

157 – Os jornalistas e os grupos de pressão – Nicolau Santos

161 – Preâmbulo em forma de parábola/Comunicação propriamente dita em formato de conto infantil e com notícia de cidade a encerrar – António Esperança

166 – O desporto desfocado ou as pessoas que o desfocam… – Bruno Neves

167 – Televisão e deontologia – Mário Castrim

170 – As vítimas da Imprensa e as relações dos jornalistas com as polícias e os tribunais – José António Cerejo

175 – A informação regional – José Gabriel Ávila

III — Deontologia: Incompatibilidades e Código Deontológico

179 – Regras deontológicas infringidas – Santos Mota

181 – Essa palavra ética e essa outra deontologia – Olga Serra Cruz

186 – Recusa da cumplicidade – Rui Osório

189 – Contribuição para a história do nosso código deontológico – João Arnaldo Maia

200 – Os jornalistas e o direito de ser informado – Armando Pereira da Silva

203 – Da necessidade e urgência de um novo Código Deontológico – João Arnaldo Maia

206 – A matemática da deontologia e o binómio direitos/deveres – Fernando Cascais

212 – Comunicação – João Paulo Guerra

214 – Incompatibilidades, hipocrisia e relações públicas – José António Cerejo

218 – Deontologia: mito e realidade – Luís Humberto Marcos

223 – Propostas para um novo quadro deontológico – Joaquim Fidalgo, Jorge Alves, José Queirós e Manuel Tavares

225 – Algumas respostas às questões gerais sobre o exercício da profissão – Jorge Wemans

232 – Responsabilizar as fontes – José Pedro Castanheira

235 – Poirot e a criada da vizinha – Henrique Monteiro

238 – Basta de impunidade – Miguel Sousa Tavares

244 – O crime compensa – José Manuel Barata Feyo

SECCÇÕES

Correspondentes portugueses no estrangeiro

251 – Definição do estatuto de correspondente – António de Figueiredo

256 – Da deontologia à falta de rigor e de estrutura informativa portuguesa no estrangeiro – Manuel Lopes

264 – A cobertura directa da actualidade internacional – Paulo Camacho

Ensino do jornalismo, acesso à profissão e formação profissional

268 – Deontologia, ensino e formação profissional de jornalismo – Carlos de Melo

272 – A deontologia da Comunicação Social – Luís de Araújo

278 – A autonomia do campo jornalístico: uma dupla estratégia – Nelson Traquina

281 – Formação profissional: começo e futuro – Luís Humberto Marcos

286 – Jornalismo e literatura: enlace e desencontro – José Jorge Letria

291 – O acesso à profissão de jornalista – José Carlos Rodrigues

293 – E, no entanto, eles movem-se – Hermínio dos Santos

297 – Na era dos feiticeiros – José Rodrigues dos Santos

Audiovisuais

301 – Notícias do Galinheiro – Jorge Simões e Luciano Rocha

303 – Se Berlusconi aqui estivesse… José Goulão

Temas diversos

307 – Origem da Tipografia e do jornalismo nos Açores: o contributo da Maçonaria para a difusão do liberalismo – António Valdemar

314 – Jornalistas pela paz – Fernando Semedo

317 – Jornalismo e desenvolvimento dos povos – Jardim Gonçalves

322 – Liberdade de informação e deontologia: a tentativa de extinção da ANOP – Fernando Valdez

325 – Defesa do sector público e liberdade de informação – Fernando Valdez

327 – O rato do Poder e o gato da Informação – César Príncipe

CONFERÊNCIAS

331 – Os tempos de crise voltaram … – Edouard Guibert

341 – As experiências de um jornalista perante um escândalo político – Valentin Popescu

MOÇÕES

351 – Moção I – Jorge Wemans

353 – Moção II – César Manuel Camacho

354 – Moção III- Fernando Valdez, Álvaro Esteves e António Santos

355 – Moção IV – Carlos Gil

DOCUMENTOS

359 – Princípios internacionais da ética profissional no jornalismo

362 – Código Deontológico

365 – Extractos dos Estatutos do Sindicato dos Jornalistas

366 – Anteprojecto de Código Deontológico do Jornalista

372 – Nota da Direcção do Sindicato dos Jornalistas ao anteprojecto de Código Deontológico do Jornalista

374 – Reflexão alternativa I do grupo de trabalho

381 – Reflexão alternativa II do grupo de trabalho

384 – A Deontologia dos jornalistas – algumas notas para a sua história – Alberto Arons de Carvalho

394 – Deontologia e ética editorial na vida de um jornal centenário

REGULAMENTO

379 – Regulamento

COMISSÕES E APOIOS

405 – Comissão organizadora

406 – Comissão Executiva, Secretariado e Comissão de Redacção

407 – Apoios

Nota — A edição do livro do 2º Congresso está esgotada.

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