SJ contesta propostas de lei da Rádio e da Televisão

O Sindicato dos Jornalistas (SJ) considera que as propostas de lei da Rádio e da Televisão que amanhã vão ser debatidas na Assembleia da República aumentam a concentração e ameaçam o pluralismo.

Em comunicado divulgado hoje, 6 de Julho, o SJ considera que as propostas de lei da rádio e da televisão apresentadas pelo Governo, ao invés de “alargar as normas sobre transparência da propriedade dos órgãos de informação e sobre a não concentração”, que o executivo diz pretender, constituem uma cendência aos “interesses instalados que ambicionam um quadro em que seja possível ainda maior concentração dos meios”.

O SJ adverte ainda, em relação à televisão, que a proposta legislativa em apreço “elimina a garantia de que o serviço público de radiodifusão é assegurado pela Rádio e Televisão de Portugal, SA, empresa de capitais públicos, e deixa a lei da televisão omissa quanto à titularidade da concessionária”.

É o seguinte o texto, na íntegra, do comunicado do SJ:

Propostas de lei da Rádio e da Televisão aumentam concentração e ameaçam pluralismo

A Assembleia da República discute amanhã na generalidade duas propostas e dois projectos de lei da maior importância: duas propostas do Governo – uma que visa aprovar uma nova lei da rádio e outra que revê a lei da televisão; um projecto do Bloco de Esquerda para alterar a lei sobre os estatutos da RTP; um projecto do Partido Comunista Português para revisão do Estatuto do Jornalista. Sem prejuízo da sua participação na discussão na especialidade dos referidos projectos, a Direcção do Sindicato dos Jornalistas julga oportuno e necessário fazer os seguintes comentários:

1.Gorada, na passada legislatura, com o veto do Presidente da República, a chamada lei da não concentração, que definia regras sobre transparência da propriedade e estabelecia alguns – insuficientes – limites à concentração, veio o Governo contornar o “problema”, regulando essas matérias nas propostas de lei da rádio e da televisão que apresentou.

2.O recurso agora usado traduz o propósito, já várias vezes registado pelo SJ, de alargar as normas sobre transparência da propriedade dos órgãos de informação e sobre a não concentração. No entanto, tais objectivos não são alcançados com estas propostas. Pelo contrário: com elas, o Governo cede completamente aos interesses instalados que ambicionam um quadro em que seja possível ainda maior concentração dos meios.

3.De facto, só no que diz respeito à lei da rádio, a proposta apresentada passa o actual limite de cinco rádios que podem ser detidas pela mesma entidade para nada menos de 34 rádios de âmbito local, a que acresce um número ainda indeterminado de rádios regionais mas que pode chegar à dezena.

4.Poderá argumentar-se, para atenuar o efeito da concentração, que a proposta contém a garantia de que as rádios pertencentes à mesma entidade não podem operar em áreas contíguas, mas essa garantia é muito fraca, pois todos sabemos que inúmeras emissões locais são realmente escutadas a longas distâncias, ultrapassando vários municípios.

5.O enorme poder de intervenção no espaço público que fica aberto aos grupos de media não se circunscreve apenas à titularidade das empresas de rádio, uma vez que as permitidas emissões em cadeia e a colaboração entre rádios adensam sobremaneira a possibilidade de controlo de um número ainda mais vasto de estações emissoras. Potencia-se, assim, os riscos de redução da diversidade e do pluralismo e transforma-se as rádios em meros repetidores de emissões uniformizadas e centralizadas num posto único de produção de conteúdos – informativos e outros – e de comando da sua difusão, divorciadas das realidades locais que é suposto servirem.

6.Este quadro cria também condições para aumentar o desemprego de jornalista e de outros trabalhadores, comprometendo o objectivo de profissionalização que o Governo diz pretender: com conteúdos produzidos numa central e distribuídos “a granel”, será maior a tendência para reduzir os quadros próprios.

7.Mas o desiderato manifestado de fomentar a profissionalização no sector sai totalmente gorado quando, a par da redução de postos de trabalho que a maior concentração vai gerar, se introduz a possibilidade de substituir jornalistas profissionais por meros colaboradores em nada menos de metade do tempo diário de informação.

8.Já quanto à televisão, o Governo introduz limites muito generosos para a concentração: 40% das licenças na mesma área de cobertura, sendo a proposta de lei omissa quanto à acumulação de licenças de televisão no resto do país e também quanto à acumulação com licenças de rádio. Fica, assim, aberto caminho para uma ampla concentração de licenças de rádio e de televisão nas mãos de um reduzido número de detentores.

9.Por outro lado, o Governo tem repetido – e o ministro dos Assuntos Parlamentares deu garantias nesse sentido – que não pretende e não prevê a privatização da Rádio e Televisão de Portugal, mas na sua proposta de lei elimina a garantia de que o serviço público de radiodifusão é assegurado pela Rádio e Televisão de Portugal, SA, empresa de capitais públicos, e deixa a lei da televisão omissa quanto à titularidade da concessionária.

10.O SJ entende que é chegada a hora da clarificação de posições do poder político sobre esta matéria: as leis da rádio e da televisão devem estabelecer expressamente que os serviços públicos de rádio e de televisão são assegurados por empresas de capitais exclusivamente públicos, pois só assim ficam assegurados os fins para que os mesmos foram criados.

11.O projecto de alteração aos estatutos da RTP apresentado pelo Bloco de Esquerda circunscreve-se a duas matérias: uma sobre a forma de escolha do presidente da Administração dessa Empresa, prevendo que o presidente da Administração seja eleito pela Assembleia da República por maioria de dois terços; a outra sobre o programa estratégico do presidente, prevendo que o mesmo seja aprovado pelo Parlamento.

12.Se quanto à primeira matéria o projecto é positivo, traduzindo, aliás, uma antiga proposta do SJ, já quanto à segunda suscita algumas reservas, especialmente que seja o Parlamento a aprovar objectivos como sejam as audiências.

13.O projecto de alteração do Estatuto do Jornalista apresentado pelo Partido Comunista Português incorpora propostas e posições do SJ sobre o direito de autor e o direito de participação dos jornalistas, procurando corrigir as alterações aprovadas na legislatura anterior. O SJ considera, no entanto, que o Estatuto do Jornalista carece também de alteração noutras matérias.

Lisboa, 6 de Julho de 2010

A Direcção

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