“Não são mais do que dez as normas do Código Deontológico…nem mais nem menos que as do Decálogo do Sinai…. Quem se comprometa a respeitá-las, exerce, necessariamente, um jornalismo responsável, por isso credível” – afirmou Manuel Vilas Boas, novo presidente do Conselho Deontológico (CD) dos Jornalistas, ao tomar posse do cargo.
Na sua intervenção, Manuel Vilas Boas garantiu que o CD não cairá “na tentação de colocar divisas sobre os ombros e, quais polícias de costumes, difundir um poder controlador sobre os comportamentos da classe”. Uma tal atitude não deverá no entanto ser confundida com “laxismo”, sublinhou, pois os novos membros do CD estão empenhados em não ceder “nem à infâmia nem à calúnia nem ao esmagamento dos direitos por qualquer poder abusivo”.
É o seguinte, na íntegra, o texto do discurso de Manuel Vilas Boas:
Minhas senhoras
Meus senhores
Companheiros de viagem
Não me vou perder no emaranhado da discussão sobre o sentido dos sindicatos nos dias de hoje. Quero, antes, homenagear todos os sindicalistas que lutaram pelos direitos dos trabalhadores, desde os alvores do século XX, nesse afortunado 1 de Maio de 1900 , que juntou, aqui , em Lisboa cerca de 40 mil manifestantes.
Somos em Portugal cerca de 6 mil jornalistas estando inscritos no sindicato cerca de 4 mil e quinhentos. Nas eleições de 15 de Dezembro participarm 865 associados num universo de 2837 eleitores. Actos eleitorais estão em crise tal como noutras áreas da sociedade portuguesa. Apraz-me, entretanto, registar que 60% dos sócios deste sindicato têm idades inferiores a 40 anos. Motivos acrescidos para fazer levantar a esperança de que, em próximas eleições para os corpos gerntes, se vão bater diversas listas por programas aliciadores.
Ainda antes de me debruçar sobre os meandros da deontologia dos jornalistas permiti-me que saúde os camaradas eleitos: entre eles, o presidente da Mesa de Assembleia Geral, Acácio Barradas, jornalista gasto em lutas pela liberdade, o presidente da Direcção, Alfredo Maia, generoso e competente profissional destas aturadas lides e José Carlos de Vasconcelos, histórico, quase imortal militante das causas deste sindicato. Cito ainda, pela competência e dedicação, o anterior presidente do Conselho Deontológico, Oscar Mascarenhas , porventura o mais flechado de todos, nas últimas refregas do Sindicato, a quem tenho a honra de suceder e a quem agradeço todo o apoio já prometido.
Quero tomar com respeito e contar, em todas as horas, com a criatividade dos profissionais que integram a equipa do Conselho Deontológico. por ordem na lista: Avelino Rodrigues, Luís Miguel Viana, Francisco de Vasconcelos, Maria Augusta Seixas, Ana Tomás Ribeiro, Cristina Esteves e João Francisco Vilhena.
Todos temos consciência dos dias que passam, das maquinações geradas em lugares de autocracia onde se desenhavam verdadeiros fornos crematórios… todos temos consciência do jornalismo que se faz entre nós…do jornalismo que não se faz… do jornalismo que se deixa por fazer….
Perante este cenário não cairemos na tentação de colocar divisas sobre os ombros e, quais polícias de costumes, difundir um poder controlador sobre os comportamentos da classe. Esta disposição não é, contudo, sinónimo de laxismo porque também aqui afirmamos que não cederemos nem à infâmia nem à calúnia nem ao esmagamento dos direitos por qualquer poder abusivo. Estaremos tão atentos quanto possível e agiremos tão rápidos quanto as situações o impuserem.
Permitam-me dizer, a tempo, que o Código Deontológico não deve servir apenas de lumiar para os jornalistas que, apesar das novas tecnologias, ganham, nesta profissão, o pão de cada dia com o suor do seu rosto. Estes homens e estas mulheres livres são o património desta nobre profissão que não deve ser vendável, nunca , nem em hasta pública nem por ajuste directo. Não queremos servir o mercantilismo mediático, cito uma ideia forte deste Sindicato e que o investigador de comunicação social Fernando Correia deixou transcrita, em crónica, no último número da revista do Clube dos Jornalistas: “Como clamar por uma deontologia jornalística sem simultaneamente exigir uma deontologia patronal”, nunca a redacção de um jornal ou revista, uma estação de rádio ou de televisão se pode confundir com uma qualquer fábrica de enchidos, por mais genuínos que sejam.
Porque a sobrecarga de infornação, as leituras de obrigação e de lazer vão preenchendo o disco rígido do nosso metabolismo, convido-vos para uma breve viagem ao interior do Código Deontológico dos Jornalistas Portugueses, aprovado em 4 de Maio de 1993. Completaram-se já 11 anos, narram assim as actas:
1. O jornalista deve relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade.Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso. A distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público.
2. O jornalista deve combater a censura e o sensacionalismo e considerar a acusação sem provas e o plágio como graves faltas profissionais.
3. O jornalista deve lutar contra as restrições no acesso às fontes de informação e as tentativas de limitar a liberdade de expressão e o direito de informar. É obrigação do jornalista divulgar as ofensas a estes direitos.
4. O jornalista deve utilizar meios leais para obter informações, imagens ou documentos e proibir-se de abusar da boa-fé de quem quer que seja. A identificação como jornalista é a regra e outros processos só podem justificar-se por razões de incontestável interesse público.
5. O jornalista deve assumir a responsabilidade por todos os seus trabalhos e actos profissionais assim como promover a pronta rectificação das informações que se revelem inexactas ou falsas. O jorna lista deve também recusar actos que violentem a sua consciência.
6. O jornalista deve usar como critério fundamental a identificação das fontes. O jornalista não deve revelar, mesmo em juízo, as fontes confidenciais de informação nem desrespeitar os compromissos assumidos, excepto se o tentarem usar para canalizar informações falsas. As opiniões devem ser sempre atribuídas.
Merece aqui o nosso aplauso a coragem do nosso camarada Manso Preto, miseravelmente condenado a 11 meses de prisão com pena suspensa por três anos.
7 . O jornalista deve salvaguardar a presunção de inocência dos arguidos até à sentença transitar em julgado. O jornalista não deve identificar, directa ou indirectamente, as vítimas de crimes sexuais e os delinquentes menores de idade, assim como deve proibir-se de humilhar as pessoas ou perturbar a sua dor.
8. O jornalista deve rejeitar o tratamento discriminatório das pessoas em função da cor, raça, credos, nacionalidade ou sexo.
9. O jornalista deve respeitar a privacidade dos cidadãos excepto quando estiver em causa o interesse público ou a conduta do indivíduo contradiga, manifestamente, valores e princípios que publicamente defende. O jornalista obriga-se antes de recolher declarações ou imagens, a atender às condições de serenidade, liberdade e responsabilidade das pessoas envolvidas.
10. O jornalista deve recusar funções, tarefas e benefícios susceptíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional. O jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesses.
Não são mais do que dez as normas do Código Deontológico…nem mais nem menos que as do Decálogo do Sinai…. Quem se comprometa a respeitá-las, exerce, necessariamente, um jornalismo responsável, por isso credível. E essa é a morada da expressão da liberdade.
Lisboa, 21.12.2004
Na tomada de posse da presidência do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas.
Manuel Vilas Boas