Publicidade e secretismo da Justiça em debate na Gulbenkian

“O acesso à justiça tem de ser franco, aberto, transparente”, disse o juiz desembargador Orlando Afonso, no colóquio “Os Média e a Justiça”, acrescentando que “todo o secretismo pode colocar dúvidas sobre a imparcialidade do juiz”.

No entanto, considerou Orlando Afonso, “em certos momentos processuais o segredo é de longe preferível. Até onde deve ir o secretismo? É outra questão”.

O magistrado apresentou a intervenção de enquadramento do terceiro painel do colóquio Interprofissional “Os Média e a Justiça”, que decorreu a 30 de Novembro, na Gulbenkian, dedicada aos “Direitos das partes no processo, princípio da publicidade e o direito à informação e o princípio da reserva do juiz”. Intervieram ainda na sessão a advogada Paula Teixeira da Cruz, o juiz Afonso Henrique, o procurador-adjunto Pais de Faria e o funcionário judicial Vítor Norte. O responsável do gabinete jurídico do Sindicato dos Jornalistas, Horácio Serra Pereira não pôde estar presente, por motivos de saúde, mas a sua intervenção foi lida por Avelino Rodrigues, da direcção do SJ.

Orlando Afonso defendeu uma justiça aberta, mas considera que a mediatização dos tribunais, nomeadamente através das televisões, trouxe problemas novos a uma realidade antiga. “O problema da cultura e de mentalidade é o grande problema de Portugal contemporâneo. Não sabemos onde acabam as funções de uns e começam as funções de outros”, começou por afirmar, numa intervenção intitulada “Garantias fundamentais na administração da Justiça”.

Lembrando que “a liberdade de informação situa-se no plano dos direitos fundamentais”, mas que “um direito fundamental não pode colidir com outros direitos fundamentais”, o magistrado defendeu as vantagens de uma justiça aberta. “Não inventámos nada quando falamos de publicidade das audiências. Ele já vem do direito romano. Ele é público e, por isso, chegou até aos dias de hoje”, afirmou.

Para o magistrado, “a justiça numa sociedade democrática tem necessidade de meios de comunicação social que possam informar livremente os cidadãos”. Mas a mediatização coloca problemas que não existiam, nomeadamente quanto à dimensão pública da Justiça: “Nos dias de hoje, a publicidade da audiência ultrapassou o recinto do tribunal”, afirmou. As imagens das audiências podem ser transmitidas instantaneamente.

“A liberdade de informação situa-se no plano dos direitos fundamentais”, afirmou. Mas Orlando Afonso defendeu que “existem limites à liberdade de informar”, porque “um direito fundamental não pode colidir com outros direitos fundamentais.”

Com a mediatização surgem “a informação, a contra-informação, o comentador e o editorialista que não têm tempo para pensar no que aconteceu. Isto faz surgir novos problemas, para salvaguardar a dignidade da Justiça”. Para Orlando Afonso, existe “uma tensão inelutável entre a comunicação social e a Justiça”, a qual passa tanto pela inexistência de canais de comunicação, como pelo carácter “casuístico” da comunicação social. Disse ainda que, culturalmente, “Portugal pensa que está no tempo do Santo Ofício”.

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