Nova economia, velhos direitos

Ao deparar com um movimento de concentrações sem precedentes no âmbito da comunicação social portuguesa, o Sindicato dos Jornalistas emitiu um comunicado, chamando a atenção para os efeitos nocivos desse fenómeno, que entre outras coisas põe em causa o pluralismo da informação ao diminuir as opções profissionais dos jornalistas.

1. O panorama da Comunicação Social voltou a ser agitado com o anúncio da aquisição do universo Lusomundo pela Portugal Telecom (através da PT-Multimédia), do estabelecimento de uma parceria estratégica do mesmo operador de telecomunicações com a Olivedesportos e de uma outra parceria entre a Sonae.com e a Impresa.

2. Trata-se do mais importante movimento de concentrações no sector e do mais significativo passo de que há memória em Portugal, potenciando os efeitos nocivos da concentração sobre o pluralismo informativo e pondo em causa direitos essenciais dos jornalistas.

3. Além do risco da redução – pelo menos progressiva e a prazo – da diversidade informativa, a concentração de títulos representa igualmente uma ameaça à própria liberdade de imprensa, uma vez que a concentração empresarial diminui as opções profissionais dos jornalistas e agrava o desrespeito pelos direitos laborais. Estão assim criadas condições objectivas para a ocorrência de processos, mais ou menos encapotados, de censura económica. Tais condições serão aliás seriamente agravadas sempre que a relação de trabalho assente em vínculos precários (contrato a termo, falso contrato de prestação de serviços, à peça, etc.).

4. A Nova Economia, ao assenhorear-se, apenas com propósitos de lucro, do generoso desígnio original da «web» de partilha universal de informações e ideias, está a apropriar-se ilegitimamente das criações dos jornalistas, multiplicando exponencialmente a sua difusão sem que às receitas corresponda qualquer encargo com a retribuição devida aos seus autores.

5 Com a concentração de órgãos de informação e a sua posse, através do capital social ou de parcerias estratégicas, por empresas detentoras de sistemas de telecomunicações, estão criados já não apenas poderosos grupos de média, mas sobretudo organizações tentaculares de proporções e consequências até agora inimagináveis.

6. Tais organizações arrogam-se o direito de usurpar toda a criação intelectual que designam por «conteúdos», eufemismo que serve para credibilizar serviços (portais e web-sites) com fins especificamente lucrativos. E vão a tal ponto que preparam não apenas a reutilização multiplicada dos trabalhos dos jornalistas, com a agregação total ou parcial das edições electrónicas, mas também a  fusão de arquivos e centros de documentação.

 7. Este objectivo não só questiona a protecção dos direitos de autor dos jornalistas como põe seriamente em risco o sigilo profissional, que também compromete os arquivos e centros de documentação das empresas, tal como está consagrado no Estatuto do Jornalista.

8. O Sindicato dos Jornalistas considera que não é lícita qualquer utilização de trabalhos jornalísticos, fora do órgão para o qual foram criados, sem autorização prévia e expressa dos seus autores, mesmo quando se trate de mera reprodução em suporte electrónico das edições originais em suporte impresso, radiofónico ou televisivo. Tal reutilização confere ao seu autor o direito a uma retribuição adicional.

9. A mesma protecção de direitos de autor dos jornalistas sobre as respectivas criações abrange também os materiais existentes nos arquivos das empresas, pelo que o SJ não aceitará, sem a salvaguarda daqueles direitos, qualquer fusão de centros de documentação, nem que estes se permitam ceder, mesmo ocasionalmente, materiais à sua guarda, sem a autorização prévia e expressa dos seus autores.

10. Perante o quadro ameaçador acima caracterizado, o Sindicato dos Jornalistas adverte os poderes públicos para a responsabilidade que lhes cabe na preservação dos direitos, liberdades e garantias que constituem imperativos da Constituição da República, nomeadamente no que concerne à liberdade de Imprensa e ao pluralismo da informação e opinião, alertando ainda a classe jornalística e os cidadãos em geral para os perigos que a informação utilizada como simples produto mercantil pode acarretar para o futuro da democracia em Portugal.

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