Na morte de Ernesto Sampaio

O Sindicato dos Jornalistas foi, ocasionalmente, das primeiras entidades a tomar conhecimento das circunstâncias da morte do escritor e antigo jornalista Ernesto Sampaio, pelo que assumiu o papel de «agência informativa», divulgando a propósito uma detalhada notícia.

Morreu o jornalista e escritor Ernesto Sampaio, que trabalhou nas redacções do «Diário de Notícias» e, de 1980 até à sua extinção, no vespertino «Diário de Lisboa». Vivendo sozinho desde que enviuvou, por morte da actriz Fernanda Alves, à qual consagrou o seu último livro, Ernesto Sampaio foi encontrado sem vida no átrio da sua residência em Lisboa (Trav. do Outeiro, 11, 3.º D), depois de a porteira do prédio ter sido alertada pelo uivar da cadela que ele possuia. O corpo foi removido para o Instituto de Medicina Legal, onde será autopsiado nesta sexta-feira, data em que perfazia 66 anos.

Na tentativa de encontrar parentes de Ernesto Sampaio, a polícia contactou pessoas que figuravam na sua agenda telefónica, mas só conseguiu entrar em contacto com amigos. Estes tomaram várias iniciativas no sentido de garantir um funeral condigno, intercedendo junto do presidente da Câmara, dr. João Soares, o qual, não obstante estar em campanha eleitoral, deu instruções imediatas no sentido de Ernesto Sampaio ser sepultado junto de sua mulher, no cemitério dos Prazeres, assim prestando homenagem a um dos mais extraordinários casos de amor registados em Portugal.

Ernesto Sampaio distingiu-se como poeta e ensaista, tendo sido também actor, bibliotecário e professor do ensino secundário. Na sua obra literária – que se pode inserir no âmbito do movimento surrealista, de que aliás se tornou um dos mais esclarecidos exegetas — figuram os títulos «Luz Central» (1958) e «Para Uma Cultura Fascinante» (1959) — ambos reeditados em 1990 pela Hiena Editora –, «O Sal Vertido» (1988) e «A Procura do Silêncio» (1989), também editados pela Hiena. Poemas inéditos e textos de ficção e ensaio dispersos foram editados pela Fenda em 1999, com os títulos «Feriados Nacionais» e «Ideiais Lebres». Finalmente, em 2000, meses depois da morte súbita de sua mulher num hotel do Porto, onde se encontrava a ensaiar uma peça para o Teatro São João, fez sair um livro, intitulado «Fernanda», que é um dos mais dramáticos textos alguma vez publicados em língua portuguesa, constituindo um grito de desespero e de solidão pela falta do grande amor de toda a vida. Daí o natural empenhamento dos amigos em juntá-los depois da morte.

Além dos livros já referidos, Ernesto Sampaio colaborou em várias obras colectivas, designadamente na «Antologia do Humor Português» (1969), cujo prefácio é de sua autoria, e que seleccionou e anotou de parceria com Virgílio Martinho, sob a chancela da Afrodite.

Ernesto Sampaio colaborava presentemente no suplemento «Mil Folhas», do «Público», onde exercia a função de crítico teatral. Colaborava ainda nos «Cadernos» da Companhia do Teatro de Almada, para a qual estava a traduzir a peça «Paolo Paoli», de Artur Adamov.

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