CD acusa Ricardo Rodrigues de acto de censura

O Conselho Deontológico (CD) do Sindicato dos Jornalistas acusa o deputado Ricardo Rodrigues de ter cometido um acto de censura ao apropriar-se dos gravadores dos jornalistas Fernando Esteves e Maria Henrique Espada, da revista “Sábado”, no decurso da entrevista que lhes estava a conceder, na Assembleia da República.

Em comunicado divulgado hoje, 7 de Maio, o CD considera que a acção do deputado “assume uma violação ao ponto três do Código Deontológico por configurar uma tentativa para limitar a liberdade de expressão e o direito de informar”, pelo que decidiu submeter o caso à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República, para que aprecie as infracções cometidas ao abrigo dos princípios consagrados nos pontos 1 e 2 do artigo 37.º e do artigo 38.º da Constituição da República e dos artigos 11.º e 19.º do Estatuto do Jornalista.

É o seguinte o texto, na íntegra, do comunicado do CD:

Comunicado do CD sobre o caso protagonizado pelo deputado Ricardo Rodrigues

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas apreciou o caso protagonizado pelo deputado Ricardo Rodrigues, vice-presidente da bancada do PS, que de forma ilegítima, ilegal e dolosa se apropriou dos gravadores dos jornalistas Fernando Esteves e Maria Henrique Espada, da revista “Sábado”, no decurso da entrevista que lhes estava a conceder, na Assembleia da República.

O CD subscreve a posição tomada pela Direcção do Sindicato dos Jornalistas ao condenar a atitude do deputado e de se constituir como assistente no processo resultante da queixa apresentada pelos jornalistas da revista “Sábado” no DIAP de Lisboa.

O CD condena as declarações produzidas pelo deputado no dia 5, numa conferência sem direito a perguntas dos jornalistas, na qual assumiu o furto e em que anunciou outro acto lesivo do Estado de Direito. Afirmou que tinha apenso os gravadores dos jornalistas a uma alegada providência cautelar que, segundo disse, corre termos no Tribunal Cível de Lisboa.

O CD considera falaciosa a argumentação apresentada pelo deputado para justificar a sua atitude condenável. Queixou-se das perguntas dos jornalistas, as quais constituiriam «uma violência psicológica insuportável». Questões essas que considerou «inquisitórias e persecutórias».

Francisco Assis, líder da bancada parlamentar do PS, apoiou o deputado com esta mesma linha de argumentação. Considerou que a atitude de Ricardo Rodrigues se deve ao interrogatório a que foi submetido. Mas aduziu ainda uma afirmação da maior gravidade que o CD condena com veemência. Disse que se tratou de um «gesto que qualquer um de nós podia ter num momento de reacção a quente e dominado por um sentimento de profunda indignação pelo tipo de interrogatório a que estava a ser sujeito».

Se é expectável que um deputado conheça as leis da República e não as infrinja tão grosseiramente, espera-se maior discernimento de um líder parlamentar que, em ocasião alguma, pode por palavras incitar a reacções a quente contra jornalistas sempre que os interpelados se sintam incomodados com as perguntas.

Ricardo Rodrigues desempenha um elevado cargo político e sabe, enquanto figura pública, que está sujeito ao escrutínio dos seus actos. Acedeu dar a entrevista, da mesma forma que lhe poderia ter posto termo. Acedeu dar a entrevista sem condições e depois quis impô-las quando o rumo não lhe agradou e optou pelo que designou como «acção directa».

O CD partilha a preocupação expressa pelo Sindicato dos Jornalistas, posteriormente secundada pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social, de que o material de que o deputado se apropriou pode conter material protegido pelo seu sigilo profissional.

Face a este conjunto de deploráveis factos, o Conselho Deontológico considera:

1. Que o deputado Ricardo Rodrigues exerceu pelos argumentos que aduziu um acto de censura, o qual é condenado pelo Código Deontológico do Jornalista.

2. Que se trata de um acto de «acção directa» de flagrante ilicitude, já que quaisquer instrumentos de trabalho de jornalistas só podem ser apreendidos no decurso de buscas em órgãos de comunicação social determinados e acompanhados por um juiz e na presença de um representante do Sindicato dos Jornalistas. E apenas nos casos em que seja legalmente admissível a quebra do sigilo profissional.

3. Que a acção do deputado assume uma violação ao ponto três do Código Deontológico por configurar uma tentativa para limitar a liberdade de expressão e o direito de informar.

Pela natureza dos factos, por eventuais consequências futuras e pelo estatuto de quem os perpetrou, o Conselho Deontológico submete à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República, de que Ricardo Rodrigues é membro efectivo, o pedido para que aprecie as infracções cometidas ao abrigo dos princípios consagrados nos pontos 1 e 2 do artigo 37.º e do artigo 38.º da Constituição da República e dos artigos 11.º e 19.º do Estatuto do Jornalista.

Lisboa, 7 de Maio de 2010

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas

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