Primeiros passos de uma Associação

A génese da ANJJ (Associação Nacional de Jovens Jornalistas) está em várias vontades sincronizadas para criar uma associação que defendesse o bem estar profissional dos jornalistas em início de carreira e o futuro dos que ainda estudam para aí chegar. Uma entrevista de Patrícia Paixão.

Na sala de estar da casa de Bruno Paixão, o primeiro presidente eleito para a Associação Nacional de Jovens Jornalistas (ANJJ), a televisão cospe imagens de terror «hollywoodesco». Explosões, «Boeings» que se encaixam em arranha-céus, desmoronamentos, destroços, devastação, pânico e sinistras nuvens de entulho que caçam, sem piedade, as milhares de pessoas que correm pelas quadrículas de Nova Iorque. No outro lado do mundo, há muçulmanas de lenço preto com a língua a vibrar em gargalhadas. Só que este argumento é tudo menos fictício. E é inevitável que a conversa sobre a ANJJ resvale para comentários de choque, provocados pela tragédia dos símbolos ocidentais. Às vezes, os temas cruzam-se e fundem-se. «Os jornalistas de hoje são mais que os olhos e os ouvidos do público. É em alturas como esta que me apetece responder a quem nos aponta o dedo por supostos excessos: Quer saber? Levante-se do sofá e arrisque-se».

Este vigor nas convicções é o mesmo que usa para defender estagiários explorados e estudantes de comunicação social sem lugar no mercado de trabalho. Ou quando luta contra a iletracia dos portugueses (ver caixa «Planos para o futuro»), excepto se as injustiças forem cometidas no seu local de trabalho. «Por uma questão de isenção, mesmo que o meu director fosse o maior explorador de estagiários das redacções portuguesas, nunca ergueria a bandeira da ANJJ no meu local de trabalho». E explica porque é que esta não é uma atitude comodista mas antes «profissional»: «Contrataram-me para ser jornalista e não presidente da ANJJ. Não faria sentido aproveitar-me de uma posição para beneficiar a outra». Mas a luta continua. Só que em outras paragens: «Vou falando e pressionando os directores de outras publicações e os responsáveis do governo por estas matérias.» A ideia é acabar com a exploração de estagiários, muito em voga nas redacções nacionais. «Pelo preço de um jornalista experiente, os directores contratam quatro ou cinco estagiários. São mais baratos e não têm tanta força para contestarem linhas editoriais ou critérios de selecção da informação.»

A génese da ANJJ está em várias vontades sincronizadas para criar uma associação que defendesse o bem estar profissional dos jornalistas em início de carreira e o futuro dos que ainda estudam para aí chegar. Os estatutos foram aprovados em 1998. «Rádios e jornais universitários, comissões para o estudo da imprensa universitária, decidiram juntar-se e constituir uma só organização, com mais voz. Muitos destes estudante quando chegam ao mercado de trabalho encontram dois cenários: ou são explorados ou não têm emprego”, garante. A não ser que sejam bafejados pela mesma sorte que não largou o presidente que pretende representá-los. Bruno Paixão, 25 anos, exímio dedilhador de guitarra clássica e ex-jogador do Académica de Coimbra, encontrou um estágio à medida assim que deixou as salas de aula da Faculdade de Letras da cidade dos fados– na editoria de Política do Diário de Notícias. Mas para chegar a esse patamar, ultrapassou barreiras. «Frequentava o 2.º ano de Engenharia Informática, quando entrei para a Rádio Universidade de Coimbra. A minha primeira prova foi superar esta pergunta: “Se tivesses um cão, que nome lhe davas?”» Respondeu à James Bond: «Cão, Diogo Cão.» Depois, trocou as voltas aos pais e inscreveu-se em Jornalismo, anulando logo ali a possibilidade de um dia vir a ser tratado por Senhor Engenheiro. «Se lhes contasse a minha intenção, abortavam-me os planos». Ainda estudante, abraçou outros projectos. Entre eles, a «Enviado Especial», uma revista que pretendia denunciar violações de direitos humanos, que não tinha periodicidade fixa mas contava com a vontade inabalável de um grupo de colegas que acreditava que o jornalismo poderia ser uma arma eficaz contra injustiças. «Não contamos com a enorme engrenagem que domina o mundo. Achávamos que bastava denunciar situações para as vermos resolvidas». Foi escolhido para chefiar a redacção.

Agora, é jornalista de Política na revista Focus, mestrando em Ciência Política na Universidade Lusófona, membro mais jovem da direcção da Associação Portuguesa Para o Estudo da Propriedade Intelectual e presidente da direcção nacional da ANJJ. Em 1999, quando foi eleito presidente (antes dele existiu uma Comissão Instaladora, presidida por Rosário Salvado), organizou-se o I Congresso Nacional de Comunicação Social. No ano seguinte, a ANJJ arriscava voos mais altos: «A segunda edição do Congresso e o grande fórum “Pensar Portugal”». Políticos de destaque e jornalistas de renome debateram valores sociais, humanos e éticos com as centenas de participantes (a maioria estudantes universitários) que invadiram o Pavilhão Atlântico, em Lisboa. A ANJJ também promove protocolos com entidades financeiras que patrocinam cursos de especialização aos associados da ANJJ. «Há cursos inacessíveis às carteiras de quem começa uma carreira. Os nossos associados têm acesso a cursos a preços módicos». O último – Jornalismo económico e financeiro – tinha 16 vagas a seis mil escudos cada.

Em dois anos de existência, a ANJJ angariou cerca de 800 associados. Nem todos são jornalistas a exercer a profissão. (ver caixa «Quem são eles?») “Estamos abertos a todos quantos fazem informação. Existe quem não frequente o curso de Comunicação Social mas quer vir a ser jornalista e quem, neste momento, trate a informação nas universidades mas nunca pensou em seguir jornalismo». Têm lugar numa associação de jovens jornalistas porque, segundo o presidente, todos eles são jornalistas. E para elucidar quem quer que se atrapalhe a ouvir a afirmação, Bruno ergue as palavras de Diana Andringa e defende o ponto de vista: «Um jornalista é uma pessoa culta, informada, atenta ao que se passa no mundo de forma a não apenas mostrar os factos mas a explicá-los ao consumidor da informação». É o que fazem centenas de universitários quando tratam da sua informação. «Mesmo sendo uma informação específica, direccionada para os interesses dos meios estudantis.»

A conversa acaba mas o televisor continua aceso na sala de estar de Bruno Paixão, em Lisboa. É na capital que trabalha, como a maioria dos seus colegas de profissão, mas escolheu Coimbra para abrir a primeira sede da ANJJ. «“A maioria dos meios de comunicação social estão concentrados em Lisboa ou no Porto. Só que a ANJJ foi criada a pensar também no jornalismo universitário e regional.» É assim que se justificam as quatro delegações espalhadas pelo país: Lisboa, Porto, Braga e Açores. Há um ponto nos estatutos que determina que quem escolhe a localização é o presidente. «Tenho todas as razões para fixar a sede em Coimbra: sou de lá, sou contra a centralização e é a cidade que fica a meio caminho entre as duas cidades mais importantes.» E, para Bruno Paixão, esta é uma falsa questão. Há sempre a possibilidade de estabelecer contactos virtuais com a associação. «A ANJJ está à mão de semear em qualquer computador ligado à Internet». O sítio: www.anjj.pt.

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