Notícias.pt navegam em águas turvas

Os tempos têm sido difíceis para os projectos de informação na Net. Depois da euforia, a realidade dos números obrigou a reajustamentos (e despedimentos). Mas, apesar das dificuldades, nunca houve tantos «sites» de informação. Ninguém quer ficar de fora, não vá a Internet tornar-se um bom negócio. Só que, agora, há mais moderação. Um trabalho de Mário Rui Cardoso.

O projecto Imaterial.Tv acabou por fazer jus ao nome. Não chegou a existir, apesar de ter tido uma estrutura, instalações e 40 jornalistas. Liderado por Rui Trindade, ex-jornalista do Expresso, o Imaterial.Tv criou expectativa, insinuou-se como um projecto «ambicioso», pretendendo inaugurar «um modo diferente de fazer informação na Web», mas, na hora H, faltou o mais importante – o financiamento –, obrigando a abortar a descolagem. O Imaterial.Tv foi, talvez, o exemplo mais eloquente da devastação provocada pela tempestade que se abateu sobre os projectos de informação «on-line».

De um modo geral, os responsáveis pelos «sites» noticiosos concordam que houve expectativas exageradas. Luís Delgado, director do Diário Digital, o primeiro diário de alcance nacional a ser publicado exclusivamente na Web, admite que este projecto «nasceu no meio de alguma euforia com a Internet, o que levou a que fossem cometidos erros».

O Diário Digital apareceu em Julho de 1999, por iniciativa de Luís Delgado, jornalista e colunista do DN; João Líbano Monteiro, antigo assessor do ex-ministro das Obras Públicas, Ferreira do Amaral; Fernando Maia Cerqueira, jornalista; e António Frutuoso de Melo, empresário. Em Março de 2000, com a entrada de um novo investidor, foram criados três novos «sites»: o Dinheiro Digital (informação financeira), o Desporto Digital (informação desportiva) e o Super Elite (informação social, «life-style»), cada qual com a sua redacção própria. Foram contratados jornalistas para alimentar os projectos, mas, a breve trecho, houve uma reestruturação, com cortes de pessoal. Todos os «sites» acabaram por convergir para a casa-mãe, o Diário Digital. Falou-se no despedimento de 20 jornalistas, mas Luís Delgado não confirma esse número. Diz apenas que «houve, de facto, que prescindir de pessoas, mas hoje estamos equilibrados. Funcionamos com uma única redacção de 20 jornalistas, que serve os quatro canais, e temos mais receitas do que despesas».

Nesta altura, as publicações da Caneta Electrónica [empresa que detém os quatro títulos] têm três fontes principais de financiamento: a publicidade, a venda de conteúdos para «sites» de bancos e as chamadas iniciativas «offline» – organização de congressos, debates e colóquios, com receitas geradas por patrocínios.

Delgado continua a acreditar no futuro da informação «on line» – «é um processo irreversível», diz. Garante, também, que a Caneta Electrónica «não sente a falta de um grande grupo de comunicação ou de um jornal em papel por detrás, embora no início tivessemos tido que fazer um esforço enorme para credibilizar o Diário Digital, o que conseguimos graças, sobretudo, aos colunistas que lográmos atraír para o projecto» [Mário Bettencourt Resendes, Miguel Sousa Tavares, Clara Ferreira Alves, Fernando Madrinha e Emídio Rangel assinam opinião no Diário Digital].

MEDIA CAPITAL

Idêntica medida foi adoptada pelo Portugal Diário, o outro título sonante entre as publicações generalistas de abrangência nacional com publicação exclusiva na Internet. O Portugal Diário fez um esforço de credibilização conquistando para o seu painel de comentadores nomes como António Barreto, José Cutileiro, José Júdice, Miguel Vale de Almeida, Paulo Teixeira Pinto ou José Eduardo Agualusa. O título pertence ao portal IOL, do grupo Media Capital, que, não obstante ter avançado para a Internet em Julho de 2000 – portanto, numa altura em que a Web começava a dar já sinais de «implosão» – não se conseguiu livrar de alguns incidentes de percurso. A dada altura, o IOL teve que fazer ajustamentos, despedindo dez pessoas. Entretanto, o projecto parece ter encontrado a estabilidade, mantendo-se fiel aos seus propósitos iniciais – fazer convergir num único portal os conteúdos produzidos pelas empresas de comunicação do grupo Media Capital (TVI, Rádio Comercial, Diário Económico e Semanário Económico, cada um com o seu «site» próprio). O IOL tem alguns «sites» que parecem bem implantados na Web, os casos da Rádio Comercial, do Diário Económico, para a informação financeira, e da publicação exclusivamente electrónica maisFUTEBOL, com notícias sobre o desporto-rei constantemente actualizadas (o «site» Infordesporto e as edições digitais d’ A Bola, Record e O Jogo têm, também, informação desportiva em actualização constante).

IMPRESA

Grupo que tem procurado, também, afirmar uma estratégia para a Web. A Abril/Controljornal (A/CJ) lançou-se num projecto idêntico ao IOL, o Directo. O objectivo era formar um portal de informação generalista que reflectisse os conteúdos das revistas do grupo (Visão, Caras, Casa Claúdia, Turbo, Exame, Exame Informática, etc.). O Directo funcionou durante algum (pouco) tempo com redacção própria, até que foi abandonado e substituído por dois «sites», já em 2001 – o da Visão, VisãoOnline; e o da Turbo, TurboOnline, — com notícias e serviços na área dos automóveis.

O Expresso também alinhou na euforia da Internet, com maus resultados. Em finais de Março, terminava uma aventura que a própria direcção do semanário reconhece ter sido precipitada. Durante bastante tempo, o «site» do jornal reflectiu apenas o conteúdo da edição em papel, mas, a dada altura, o Expresso resolveu começar a fazer actualizações noticiosas de última hora na Internet, para o que montou uma redacção de 26 jornalistas, com 17 estagiários contratados. Estes acabaram por não ver os seus contratos renovados. Em declarações à revista Visão, em Julho, José António Lima, director-adjunto do jornal, admitia que a publicação aumentara a redacção para a edição digital «numa altura em que havia uma euforia em relação a tudo o que dissesse respeito à Internet. O importante era marcar posição». Só que as receitas de publicidade não corresponderam ao esperado, o que levou a direcção, segundo José António Lima, a reestruturar com base na convicção de que «na Internet, o Expresso não poderia concorrer com os diários, as rádios e muito menos com as televisões», quando elas entrassem na guerra.

Mais ou menos na mesma altura em que o Expresso repensava a sua estratégia para a Web, estreava outro «site» ligado à Impresa, a VisãoOnline, este já sem a pretensão de fazer actualizações ao minuto, antes interessado em constituir-se como uma montra digital sólida para a principal «newsmagazine» portuguesa – apostando no comentário diário, numa selecção noticiosa de alguns temas do dia, num tratamento mais aprofundado de determinadas matérias e na disponibilização de informação de base, como sondagens e materiais de arquivo.

Também por esta altura, ultimavam-se os preparativos para o lançamento da SIC Online, «site» constituído à imagem da MSNBC, com notícias, ligações a alguns conteúdos das emissões televisivas e uma aposta clara no comércio electrónico como fonte de receitas. Chegou a falar-se em despedimentos na SIC Online, situação que não se confirmou, pese o porta-voz da Impresa, José Freire, ter afirmado à Visão, em Julho, que se preparavam «cerca de dez despedimentos», embora nenhum afectando a redacção da SIC Online. A estratégia de promoção do «site» tem passado por referências constantes àquilo que lá está disponível, durante as emissões televisivas da SIC – de resto, o mesmo é feito na TVI, estando a RTP menos mexida na Web.

PÚBLICO

Foi um dos primeiros jornais a lançar-se na aventura da Rede. As experiências inaugurais aconteceram em Março de 1995; dois meses depois, surgiu o serviço permanente de notícias «on-line»; em Junho do mesmo ano, teve lugar o primeiro grande projecto de cobertura em directo na Net, com as eleições legislativas; a edição diária integral do jornal passou a ter uma versão electrónica a partir de Setembro; e em 1998 o jornal avançou para modelos mais aproximados daquilo que, hoje, define a presença do Público na Net, a saber: apareceram os «dossiers» especiais, as actualizações noticiosas diárias (correspondendo àquilo que é hoje o Público Última Hora) e o Guia do Lazer.

Talvez porque a produção diária é a sua vocação, o Público tem feito um percurso electrónico sem grandes sobressaltos. José Vítor Malheiros, responsável por todos os produtos do Público.pt, diz que «a presença do jornal na Rede tem vindo sempre em crescendo. Começámos com quatro jornalistas, dois meses depois tínhamos seis, agora estamos com 40 pessoas, das quais 30 são jornalistas – 20 no Público Última Hora, seis no desporto e quatro no Guia do Lazer». Quanto ao pior momento da vida do projecto, «está a ser agora», diz José Vítor Malheiros, «porque prevíamos que 2001 fosse um ano de grande crescimento e não está a ser, estamos apenas estabilizados». «Acontece tudo muito devagar na Internet em Portugal, e penso que grande parte da responsabilidade cabe ao Estado, que devia incentivar mais a adesão ao «on-line», nomeadamente acelerando a desburocratização, fomentando uma maior e mais rápida presença de serviços públicos na Net. Se isso acontecesse, gerar-se-ia um efeito multiplicador, de emulação», afirma. Apesar de tudo, as dificuldades, no caso do Público, não se têm reflectido em despedimentos, «mas, naturalmente, vamos tendo que atrasar o lançamento de novos projectos que estão previstos para o site», diz o responsável editorial do Público.pt.

A maior parte das receitas do Público Online provém da publicidade, seguindo-se as vendas de conteúdos para outros «sites» e as comissões por participação em iniciativas de comércio electrónico. Tudo junto não dá para que o projecto se auto-financie. «Nem estava previsto que se auto-financiasse, nesta altura», refere José Vítor Malheiros. «O nosso objectivo foi sempre atingir o «break-even» no final do ano que vem, e para já não há nada que nos obrigue a reavaliar os nossos objectivos», diz. Mas as dificuldades financeiras são uma realidade indesmentível, na generalidade dos projectos para a Net. Sendo assim, quais serão os modelos de negócio adequados? Malheiros crê que «a sustentabilidade deste tipo de projectos passará pelo comércio electrónico. Neste momento, as comissões que o Público.pt recebe por participação em iniciativas de comércio electrónico são escassas, mas penso que o futuro passará por aí. Nunca pensei que a publicidade, por si só, pudesse ser uma fonte suficiente de receitas», garante.

PT/LUSOMUNDO/SAPO

O SAPO (Serviço de Apontadores), idealizado, há anos, por estudantes da Universidade de Aveiro, está hoje transformado num dos maiores portais da Internet portuguesa, inclusivé para serviços informativos na Rede – dado pertencer à PT e, por via desta, concentrar os conteúdos das empresas de comunicação da Lusomundo. É outro exemplo de convergência na Rede. Na página de abertura do SAPO, os serviços noticiosos são assegurados pela TSF, pela Lusa (sem o pingar contínuo de telexes, como nas redacções, mas com uma selecção noticiosa efectuada ao longo de todo dia), o Infordesporto e o Tek SAPO (para a informação tecnológica). Presentes, também, na página de abertura do SAPO, estão «links» para o Diário de Notícias, Jornal de Notícias, Diário de Notícias da Madeira e Açoriano Oriental [publicações da Lusomundo], mais as informações provenientes do canal Voxpop – informação musical produzida pela Valentim de Carvalho, que procura, assim, tirar partido de sinergias com o SAPO, na venda de discos através da Internet. Em termos de negócio, a constelação PT/Lusomundo/SAPO procura gerar receitas de publicidade e de comércio electrónico, retirar benefícios de exposição das diversas marcas que constituem o seu universo editorial e potenciar, ao máximo, a oferta Lusomundo na área do cinema – venda de vídeos e de bilhetes de cinema online e promoção dos filmes em cartaz nas salas Lusomundo.

COFINA

Através das suas participadas Investec e MediaFin, e também com a compra do grupo editorial Ferreira & Bento, a Cofina constituíu, igualmente, um importante portal informativo, constituído pelos sites das publicações Automotor, Correio da Manhã, Record, Máxima, PC Guia, Rotas & Destinos, Jornal de Negócios/Canal de Negócios e ZD Net (informação tecnológica). A aquisição da Chip 7 denota, também, a aposta da Cofina na obtenção de receitas por via do comércio electrónico. Mesmo sem grandes grupos de comunicação que os suportem, publicações como O Independente e o Euronotícias também não prescindem de uma presença na Web.

REGIONAIS

O facto de a generalidade dos projectos de informação na Web ainda viverem com uma espada sobre a cabeça não tem impedido que subsistam algumas iniciativas (e apareçam outras) com menor suporte financeiro. É o caso do Setúbal na Rede, a primeira publicação exclusivamente digital da Internet portuguesa, lançada em Janeiro de 1998 por um antigo operador da TSF, Pedro Brinca. O título começou com uma estrutura amadora, vivendo da carolice dos colaboradores. Hoje tem seis pessoas remuneradas, a tempo inteiro, e paga aos colaboradores. Para se financiar, o Setúbal na Rede – vencedor do Prémio Gazeta de Jornalismo, na categoria de Imprensa Regional, em 1999 – recorre a receitas publicitárias e a patrocínios de iniciativas realizadas fora do âmbito da Internet, como seja a organização de seminários, congressos e debates sobre temas relacionados com o distrito de Setúbal. «Ainda me deito com angústias para manter o projecto, mas levanto-me sempre com esperanças. Neste momento, temos receitas no limite para ir pagando o Setúbal na Rede», diz Pedro Brinca.

Na região Oeste, há 15 jornalistas, grande parte deles correspondentes de jornais nacionais, que também não parecem amedrontados com a perspectiva de um fracasso na Internet. Resolveram mobilizar-se em torno do projecto de portal regional OesteDiário, propriedade dos jornalistas Joaquim Ribeiro e António Barbosa e do técnico de comunicação Carlos Robalo. Paulo Pinto, correspondente da RDP e responsável editorial do OesteDiário, sublinha as «madrugadas passadas a preparar o site», que já está no ar, apoiado por tecnologia e «know-how» da Portugal Net, e exibindo um profissionalismo assinalável. Paulo Pinto diz esperar «obter receitas da publicidade e do comércio electrónico», bem como «encontrar financiadores».

O próprio Jornal do Fundão, velho ícone da imprensa regional, prometeu fazer a sua aparição na Web – com uma estrutura idêntica à da edição em papel, disponibilizando últimas notícias sempre que se justificar e proporcionando fóruns de discussão. Mas essa é já outra história, uma vez que a mítica folha beirã pertence, há mais de dois anos, ao grupo Lusomundo.

SITES REFERIDOS NO ARTIGO

GENERALISTAS

www.diariodigital.pt

www.portugaldiario.iol.pt

www.visaonline.pt

www.expresso.pt

http://lusa.sapo.pt

www.jn.pt

www.dn.pt

www.correiodamanha.pt

www.oindependente.pt

www.euronoticias.pt

FINANCEIROS

www.dinheirodigital.pt

www.de.iol.pt

wwwsemanarioeconomico.iol.pt

www.negocios.pt

DESPORTO

www.desportodigital.pt

www.maisFUTEBOL.iol.pt

www.abola.pt

www.record.pt

www.ojogo.pt

www.infordesporto.pt

TELEVISÕES

www.tvi.pt

www.sic.pt

www.rtp.pt

RÁDIOS

www.diariodigital.pt

www.tsf.pt

OUTROS

www.superelite.pt

www.turboonline.pt

http://tek.sapo.pt

www.automotor.pt

www.maxima.pt

www.pcguia.pt

www.zdnet.pt

www.rotasedestinos.pt

www.setubalnarede.pt

www.oestediario.pt

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