Fundação do Sindicato dos Jornalistas de Timor

José Luiz Fernandes, membro da Direcção do Sindicato dos Jornalistas, esteve em Timor Leste na altura do nascimento da organização sindical dos jornalistas timorenses, à qual deu o apoio da sua experiência. Nesse sentido, o seu testemunho histórico, que aqui apresentamos, é fundamentado num conhecimento privilegiado da situação.

O Sindicato dos Jornalistas de Timor Lorosa’e (SJTL) foi constituído em 22 de Julho de 2001, por 42 dos 55 jornalistas então em actividade em Timor Leste.

Nesse dia foi concluída a assembleia constituinte do SJTL com o fim da aprovação dos Estatutos e a eleição da Comissão Instaladora, composta pelos seguintes sete jornalistas: Adérito Hugo da Costa, Carmen da Cruz, Indra Monemnasi, José Felipe, Nelio Isaac, Otelio Ote e Rodolfo Sousa.

A 17 de Agosto, após o seu registo oficial, o SJTL divulgou uma Declaração de Princípios, na qual se afirma como “a única organização verdadeiramente representativa dos profissionais do Jornalismo” em Timor Leste.

O SJTL “exercerá a sua actividade com total independência relativamente ao Estado, ao patronato, ao governo, partidos políticos, igrejas, ou quaisquer agrupamentos de carácter político, económico, religioso ou outros”.

Na declaração, o SJTL afirma, também, a necessidade da criação da Carteira Profissional de Jornalista em Timor Leste, de um Estatuto do Jornalista e de um Código Deontológico.

A constituição do SJTL em 22 de Julho foi o culminar de um processo iniciado em Fevereiro de 2001 por um grupo de jornalistas, que decidiu criar uma organização profissional para defender os seus direitos e contribuir para a regulamentação da actividade jornalística em Timor Leste.

Em Janeiro de 2001, a denominada Associação de Jornalistas de Timor Lorosa’e (AJTL) – criada por jovens activistas políticos colaboradores de órgãos de Informação – tivera o apoio de organizações indonésias, australianas e norte-americanas para organizar um congresso de jornalistas.

Reuniu então cerca de 200 pessoas em Díli, mas que na sua maioria não eram jornalistas. Participaram activistas de várias ONG, publicistas diversos e até crianças de 12 anos colaboradoras de jornais escolares. Contudo, alguns dos jornalistas profissionais timorenses nem sequer foram convidados a estar presentes.

A AJTL nunca manifestou uma autêntica preocupação pelos problemas dos jornalistas timorenses. As suas actividades revelaram-na progressivamente como a fachada “timorense” de estratégias estrangeiras que investiram forte no sector da comunicação social em Timor Leste.

Esta associação, segundo declaração do seu próprio presidente, Virgílio Guterres, vive de dinheiro da UNESCO que lhe é obtido pela SEAPA (South East Asia Press Alliance), uma organização com sede na Tailândia e escritório em Jacarta.

É também a partir de Jacarta que actua em Timor a organização norte-americana Internews, cujos executivos em Timor Leste são sobretudo australianos, embora a Austrália tenha a sua própria organização no terreno, a APHEDA. No sector actua ainda a USAID, a bem conhecida agência norte-americana.

Estas organizações dispõem de fundos que utilizam abundantemente em Timor Leste. Oferecem carros, motas, computadores e outros equipamentos; propiciam viagens, particularmente à Austrália e à Indonésia; compram grande parte das tiragens de alguns jornais; dão training (formação profissional) em Inglês e, por vezes, em Bahasa indonésio; em Português nunca e em Tétum só de quando em quando, para prevenirem eventuais acusações de hostilidade à língua nacional.

A actuação destas organizações em Timor Leste tem a cobertura dos serviços da UNTAET que superintendem na comunicação social, nomeadamente na Rádio e na TV públicas, onde os cargos de direcção e de chefia estão entregues a “internacionais” de língua inglesa com uma excepção: o responsável pelo Departamento de Português na Rádio UNTAET é um peruano!

A AJTL ficou definitivamente desacreditada quando os trabalhadores timorenses da Rádio e da TV UNTAET entraram em greve, a 13 de Julho. Questionado por alguns jornalistas sobre a atitude da associação, o seu presidente respondeu que nada podia fazer.

Os jornalistas e técnicos da Rádio e da TV entraram em greve porque a UNTAET queria renovar-lhes os contratos de trabalho só por mais um mês. Anteriormente, a duração era de três meses e os trabalhadores pretendiam seis meses, prazo que, aliás, fora o praticado no início da sua contratação. Paralelamente, estava em discussão o excessivo número de horas de trabalho e sem qualquer pagamento suplementar.

A disputa arrastava-se desde o início do mês e a 13 de Julho, sexta-feira, à noite, os trabalhadores decidiram entrar em greve e anunciaram aos microfones da Rádio UNTAET que só voltariam ao trabalho na quarta-feira seguinte.

O impacto da greve foi grande, pois o fim-de-semana estava repleto de acontecimentos políticos, como o Congresso da Fretilin e o início da campanha eleitoral para a Assembleia Constituinte.

A questão foi resolvida no domingo, ao fim da tarde, após indicações expressas nesse sentido dadas pelo responsável das NU no território, Sérgio Vieira de Mello. A UNTAET propôs a renovação dos contratos por três meses, o pagamento de horas extraordinárias e a passagem ao escalão seguinte da tabela remuneratória. Jornalistas e técnicos retomaram o trabalho na segunda-feira, dia 16, de manhã.

Para a tomada de posição dos trabalhadores foi importante o processo em curso de formação do Sindicato dos Jornalistas. Aliás, alguns dos elementos mais activos no processo que levou à greve eram alguns dos jornalistas mais empenhados na formação do sindicato, o que levou um a deles a afirmar perante a posição da UNTAET: “É a primeira vitória do Sindicato!”.

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