Direito de retificação em formato digital: queixa contra o Notícias ao Minuto

Conselho Deontológico

Queixa nº 7/Q/2025

Queixa contra o Notícias ao Minuto por causa de um pedido de retificação

A queixa:  

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas (CD) recebeu uma queixa de Fernando Oliveira Figueira contra a jornalista Catarina Carvalho Ferreira do portal Notícias ao Minuto. O queixoso invoca o seu direito ao bom nome e um alegado incumprimento do pedido de retificação de um artigo assinado pela jornalista, que foi publicado a 18 de julho de 2025 com o título “Queixas contra Mastiksoul arquivadas. Músico diz estar a ser perseguido”.

Procedimentos:

  1. O CD enviou um email à jornalista Catarina Carvalho Ferreira (CCF) onde elencou os motivos invocados por Fernando Oliveira Figueira (FOF), músico de profissão – que utiliza o nome artístico Mastiksoul – na comunicação que enviou para este órgão de natureza recomendatória.
  2. Factos invocados pelo queixoso:
    a) Na queixa dirigida ao CD, FOF afirma que a jornalista acima mencionada assinou uma notícia publicada no dia 18 de julho de 2025, no Notícias ao Minuto, com o título: “Queixas contra Mastiksoul arquivadas. Músico diz estar a ser perseguido”. O queixoso refere ainda que nesse artigo se menciona que ele havia sido condenado por violência doméstica, em 2021. FOF também afirma que a informação sobre a sua condenação é “falsa, pois tal decisão foi revogada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 2022, com consequente absolvição definitiva do queixoso”.
    b) O queixoso também refere que o seu advogado, Dr. Jorge Manuel Pote, terá comunicado à jornalista que a notícia publicada a 18 de julho “estava incorreta”, tendo solicitado um pedido de retificação. Dias mais tarde, a 1 de setembro, a Dominant Artists Unipessoal Lda, empresa representante do queixoso, reiterou o pedido de retificação, solicitando que a mesma fosse feita num prazo de cinco dias úteis.
    c) O queixoso enviou ao CD um PDF do email enviado pelo seu advogado para o endereço eletrónico da jornalista do Notícias ao Minuto, e outro PDF do email enviado pela Dominant Artists para o email da jornalista e outros dois endereços digitais do já citado portal, em simultâneo.
  3. Perguntas do CD à jornalista:
    a) O queixoso afirma que o Notícias ao Minuto não publicou a retificação da notícia pedida pelo seu mandatário e pela Dominant Artists: é verdade?
    b) Caso a sua resposta seja negativa agradecemos que nos envie o link com a retificação.
    c) Caso seja afirmativa perguntamos por que motivo optaram por não publicar o pedido de retificação?
    d) Numa segunda etapa de perguntas de pedido de esclarecimentos do CD a CCF, este órgão informou a jornalista sobre os dois endereços eletrónicos para os quais a Dominant Artists tinha enviado mensagens para o Notícias ao Minuto; um deles foi o endereço geral@noticiasaominuto.com.

 

Análise:

I. Respostas da jornalista:

  1. A jornalista afirma que o email do advogado de FOF terá sido enviado numa data em que CCF se encontrava de férias. CCF diz que considera “estranho” que na redação ninguém tenha visto o email da Dominant Artists para o endereço info@noticiasaominuto.com. CCF também diz que o endereço eletrónico geral@noticiasaominuto.com “não existe”, e informa que “nenhuma das editoras do Notícias ao Minuto foi contactada, nem recebemos qualquer chamada telefónica sobre o caso em questão”.
  2. CCF esclarece que o artigo por si assinado “tem por base um vídeo publicado pelo senhor Fernando Oliveira Figueira, vídeo esse que está disponível na mesma notícia. As declarações feitas nestas imagens são citadas e fica claro que, segundo o próprio, «o Ministério Público […] considerou que não cometeu qualquer crime» e foram arquivadas todas as queixas até aqui apresentadas contra si – esta informação é explicita, dita pelo próprio e está clara no artigo. Inclusive no título do mesmo. Ainda assim, pareceu-me relevante referir que em 2021, numa primeira instância, existiu uma condenação por violência doméstica. Esta informação foi pública na altura, confirmada pelo tribunal e divulgada em diversos órgãos de comunicação social. O próprio reagiu publicamente ao caso, na época”.
  3. A jornalista afirma ainda que “por considerar que ficava claro que mais tarde a condenação terá sido revogada – uma vez que o próprio diz, citado no artigo, que todas as queixas até aqui apresentadas contra si foram arquivadas – não surgia na notícia a informação de que esta condenação terá sido revogada mais tarde. Ainda assim, volto a referir, existiu sempre total disponibilidade para corrigir ou acrescentar ao artigo informação que o visado considere relevante”.
  4. A jornalista comunica que a “correção” foi efetuada logo que o “contacto se revelou eficaz”, e enviou o link onde pudemos verificar – após leitura comparada com a captura de ecrã enviada pelo queixoso – uma alteração no último parágrafo no dia 10 de outubro. Acontece que essa alteração só foi detetável porque o CD cotejou a versão alterada depois das nossas perguntas com a versão inicial, que desapareceu por completo, deixando de estar acessível no portal.
  5. O texto – no dia em que foi redigida esta recomendação – mantém a data de 18 de julho, tendo sido acrescentada uma referência no final onde se lê: [Notícia atualizada a 10 de outubro de 2025]. Mas quem não tiver acesso a uma captura de ecrã da versão inicial não sabe o que foi alterado.
    a) Na primeira versão que foi publicada a 18 de julho, lê-se no último parágrafo: “Recorde-se que a polémica que envolve o músico e a ex-mulher dura já há vários anos. Mastiksoul foi condenado pelo crime de violência doméstica em 2021, porém as trocas de acusações prosseguiram e duram até hoje”.
    b) Na segunda versão, retificada a 10 de outubro, lê-se no último parágrafo: “Recorde-se que a polémica que envolve o músico e a ex-mulher dura já há vários anos. Mastiksoul foi condenado pelo crime de violência doméstica em 2021, tendo sido a decisão revogada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 2022, com consequente absolvição definitiva do queixoso”.

II. Das provas apresentadas por Fernando Oliveira Figueira:

6. O músico anexou à queixa que enviou ao CD contra a jornalista, uma outra queixa por crime de difamação que havia dirigido ao Ministério Público, no dia 8 de setembro.

7. O CD entendeu não considerar a queixa enviada ao Ministério Público na análise deste caso, porque o Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas é um órgão com poder recomendatório sobre questões deontológicas do jornalismo. Acresce ainda recordar o que está expresso no ponto 3 do Artº 14 do Estatuto do Jornalista: “Sem prejuízo da responsabilidade criminal ou civil que ao caso couber nos termos gerais, a violação da componente deontológica dos deveres referidos no número anterior apenas pode dar lugar ao regime de responsabilidade disciplinar previsto na presente lei”.

 

Conclusão: 

Nos termos da análise da queixa enviada por Fernando Oliveira, o CD considera que se deve pronunciar:

  • Sobre os termos em que foi feita a retificação pelo órgão de comunicação digital Notícias ao Minuto.
  • Sobre o direito ao bom nome que FOF invoca na queixa que dirigiu a este órgão, e o facto de CCF não o ter contactado antes de publicar o artigo de 18 de julho.
  • O CD não se pronuncia sobre os emails que o queixoso diz terem sido enviados e a jornalista diz que não foram recebidos, porque essa averiguação não se encontra no âmbito de atividade deste órgão:
    a) A jornalista modificou o artigo logo que foi interpelada pelo CD.

Recomendação:

  1. O CD considera que apesar da legislação não referir especificamente os órgãos de comunicação que só funcionam em suporte digital, tal não isenta estes órgãos de estarem vinculados ao dever de viabilizarem os pedidos de retificação de artigos que lhe são dirigidos.
  2. O CD entende que um pedido de retificação deve sempre remeter para a notícia original, e recomenda que esta não seja eliminada e seja sempre claramente enunciado o que foi alterado no artigo retificado, coisa que não se verificou no caso do artigo que foi publicado no Notícias ao Minuto.
  3. O CD recomenda que todos os órgãos de comunicação criem – caso não o tenham já feito – um manual interno que permita esclarecer todas as dúvidas sobre estes casos. Esse manual deve passar pelo respetivo Conselho de Redação, e ser objeto de debate com a redação.
  4. O CD considera que a jornalista do Notícias ao Minuto deveria ter contactado Fernando Oliveira Figueira sobre o arquivamento das queixas relatado no artigo do Notícias ao Minuto. O Código Deontológico dos Jornalistas é taxativo no Artº 1: “Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso”. Ouvir as partes significa contactar as partes para escutar a versão delas para elaborar posteriormente uma notícia, que nunca deve ser construída exclusivamente com base em publicações feitas em redes sociais, como efetivamente aconteceu, não dando oportunidade ao queixoso de dar a sua versão sobre aquilo que alega ser um ataque ao seu bom nome, que afirma já lhe ter causado danos.
  5. O CD considera que um tema como a violência doméstica – um dos mais graves problemas que atravessa a nossa sociedade – deve ser noticiado com um enquadramento mais amplo do que aquele que foi feito pelo Notícias ao Minuto. Não basta dizer que uma condenação foi revogada, é preciso dar uma explicação breve sobre o motivo, porque isso faz parte das boas práticas jornalísticas. Recorde-se que em 2019, o Sindicato dos Jornalistas foi uma das organizações que divulgou no seu site um Guia de boas práticas para jornalistas sobre prevenção e combate à violência de género (https://jornalistas.eu/wp-content/uploads/2019/09/GuiaBoasPraticas.pdf).

Lisboa, 25 de novembro de 2025

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas

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