SJ analisa programa do Governo para os média

O Sindicato dos Jornalistas (SJ), tendo analisado o programa do Governo para a comunicação social, decidiu dar conta das suas reflexões ao ministro da tutela, Morais Sarmento, a quem solicitou uma reunião com carácter de urgência.

Em carta enviada a 5 de Agosto, ao ministro Morais Sarmento, o SJ “começa por registar o compromisso solene de envolvimento de ‘todos os parceiros da comunicação social’ na reforma da regulação contida” no Programa do Governo.

Reafirmando “o princípio da sua independência e valorizando a autonomia das suas opiniões, críticas e propostas”, o SJ “renova a sua plena disponibilidade para colaborar com o Governo e com a Assembleia da República nas iniciativas e nos actos legislativos que a cada qual incumbe tomar sobre todas as matérias que importam à vida do sector e determinam o seu futuro”.

Sobre as medidas contidas no Programa do Governo, o Sindicato dos Jornalistas transmitiu ao ministro Morais Sarmento as seguintes opiniões:

1. Reestruturação empresarial e de conteúdos da RTP e da RDP

a) A redacção adoptada pelo XVI Governo relativamente ao seu compromisso de “aprofundar e consolidar o processo de reestruturação empresarial e de conteúdos” suscita reservas, por poder representar um risco de governamentalização das empresas de serviço público de rádio e de televisão. O que se espera que o Governo pretenda é incentivar o Conselho de Administração a desenvolver um programa de modernização da RTP e da RDP, conferindo-lhe autonomia para tal e abstendo-se, em qualquer circunstância, de interferir na “reestruturação de conteúdos”.

b) O projecto do canal “A Dois”, o desenvolvimento das opções no cabo e o processo de autonomização dos centros regionais da RTP na Madeira e nos Açores deveriam ser acompanhados por grupos de análise e consulta integrando também as organizações representativas do sector.

c) O SJ regista e estará atento à concretização da orientação governamental no sentido de evitar que a fusão dos serviços da RTP e da RDP “afecte a identidade e a missão de cada empresa”, mas espera encontrar na atitude das respectivas empresas uma expressão concreta de tal cuidado.

2. Agência Lusa

O SJ também considera a Agência Lusa um importante serviço público cuja independência e credibilidade devem ser plenamente asseguradas. Tendo em conta que a informação é a sua actividade exclusiva, o SJ considera que quaisquer “novos produtos e áreas de negócio” a desenvolver devem ser objecto de cuidada análise designadamente quanto aos seus efeitos na credibilidade da informação jornalística que produz e distribui e nos direitos dos jornalistas ao seu serviço.

3. Comunicação social regional e local

a) O Programa do Governo assume a tendência não só para pactuar, mas também para estimular o processo de concentração empresarial, ainda que afirme pretender que esta “coexista de forma harmoniosa com as iniciativas de pequena e média dimensão”. Na eventualidade de pretender retomar os diplomas aprovados pelo Governo anterior, e em particular a lei da rádio, é imprescindível que o Executivo reconsidere as medidas então definidas.

b) São já do conhecimento do Governo as posições muito claras do Sindicato dos Jornalistas quanto aos diplomas relativos à actividade de radiodifusão, incentivos ao sector, publicidade, publicidade do Estado e porte pago, bem como as observações e propostas que apresentou. Retomando o Executivo o processo legislativo anteriormente iniciado, o SJ apela para que tais contribuições sejam efectivamente tidas em conta.

c) O Sindicato reafirma a sua reivindicação do direito à efectiva participação no processo legislativo, assim como renova a sua disponibilidade para analisar com o Governo as críticas e sugestões já apresentadas por iniciativa própria, face à ausência de qualquer consulta a esta organização.

d) O SJ sublinha também a necessidade de que matérias como a actividade de radiodifusão sejam discutidas de forma mais ampla e legisladas em sede própria, que é a Assembleia da República.

4. Regulação

a) O Governo retoma o projecto de “profunda alteração” da regulação do sector, anunciando um modelo de gestão assente num “conselho de administração independente e representativo, competente e bem apoiado por painéis de especialistas”, o qual, num “segundo momento” será “federado” com o Instituto das Comunicações e com a Autoridade das Comunicações. Sem prejuízo da análise detalhada de tais projectos, o Sindicato dos Jornalistas manifesta desde já reservas à “federação” de órgãos de regulação, pelas seguintes razões essenciais:

i) Desvalorização da importância da regulação dos média e da actividade informativa em particular, eventualmente diluída na amplitude e na complexidade da hiperestrutura em vista;

ii) Diminuição da independência do órgão de regulação dos média, designadamente face ao elevado peso dos interesses económicos do sector das telecomunicações (infra-estruturas e serviços) e também em relação ao risco de predomínio de representantes de escolha governamental.

b) A forma como o Governo enuncia as suas ideias relativamente ao modelo regulatório em concreto, assim como quanto à sua evolução, parece evidenciar o carácter consolidado dos projectos. Desconhecem-se as pessoas – singulares ou colectivas – eventualmente consultadas pelo Executivo, sendo certo que o Sindicato dos Jornalistas não foi ouvido sobre esta matéria.

c) Ao registar como positivo o compromisso, expresso no Programa de Governo, de concluir o processo de alteração do quadro regulador “envolvendo todos os parceiros da comunicação social”, o SJ não só reafirma a sua disponibilidade para nele participar activamente, mas também espera que o envolvimento prometido represente uma efectiva participação na discussão das propostas e apresentação de alternativas.

d) No domínio da co-regulação, o SJ considera positiva a intenção de obter soluções “que envolvam os operadores e os profissionais do sector”, mas espera que tal envolvimento se traduza numa efectiva participação dos legítimos representantes do sector e dos seus profissionais, para a obtenção de propostas genuinamente debatidas e contratualizadas. Mais uma vez, o Sindicato reafirma a sua firme vontade de colaborar e de participar no processo, exercendo aliás os direitos que constitucionalmente lhe assistem.

5. Novas plataformas

a) O Sindicato dos Jornalistas regista a sensibilidade do Governo para a importância da regulação das actividades suportadas em novas tecnologias, assim como a necessidade de reflexão sobre a experiência já adquirida neste domínio, pelo que propõe desde já que esta incida especialmente sobre:

i) a solidez empresarial dos projectos;

ii) as expectativas – geradas e satisfeitas, ou não – dos novos projectos;

iii) a colisão com direitos dos jornalistas, dos públicos e das pessoas objecto da actividade de tais meios;

iv) a necessidade de regulamentação específica de actividades em algumas

plataformas, designadamente no on-line.

b) O Sindicato saúda a intenção do Governo de lançar uma discussão pública sobre o futuro do audiovisual com vista à definição de uma estratégia nacional para esta área.

A finalizar a sua carta ao ministro Morais Sarmento, o SJ reafirma a sua disponibilidade para participar naquela discussão e para colaborar em iniciativas específicas, salientando “que a ideia de estratégia nacional deve implicar a participação do conjunto das forças partidárias, assim como os movimentos sociais, culturais e cívicos, sem a qual será irremediavelmente condenada ao fracasso ou tomará o destino das decisões autocráticas”.

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