Ribeiro Cardoso lança «O Fim do Império»

O Fim do Império – Memória de um Soldado Português – O 7 de Setembro de 1974 em Lourenço Marques, do jornalista Ribeiro Cardoso, chega às livrarias a 11 de Fevereiro. O lançamento decorrerá no dia 13, pelas 18 e 30, na livraria Leya na Buchholz, em Lisboa. A apresentação estará a cargo do coronel Aniceto Afonso.

Segundo o autor, “trata-se de uma história real que tem por fundo a colonização, a guerra colonial e a descolonização – e tem por centro o 7 de Setembro de 1974, dia em que os brancos extremistas de Lourenço Marques assaltaram o Rádio Clube de Moçambique na tentativa de impedir a promulgação dos Acordos de Lusaka”.

Tais acordos, lembra, “tinham sido assinados horas antes na capital da Zâmbia por representantes de Portugal e da Frelimo e estabeleciam os mecanismos da transferência de poderes que levariam à independência de Moçambique – o que certos brancos não aceitavam”.

Ora, é neste contexto – sublinha – “que o assalto à Casa da Rádio, que durou três longos dias, foi efectuado, com os assaltantes, de microfone aberto, a apelar à intervenção da África do Sul e da Rodésia (os dois países do apartheid com quem Moçambique tinha fronteiras)”.

Pior ainda, destaca: “A PSP foi cúmplice e o desnorte das cúpulas das Forças Armadas em Lourenço Marques foi gritante, com Spínola mexendo os cordelinhos a partir de Lisboa”.

Ribeiro Cardoso, que como alferes miliciano tinha sido mobilizado para Moçambique, no 7 de Setembro encontrava-se no centro do furacão: logo a seguir ao 25 de Abril fora nomeado pelo MFA local para integrar a Comissão Militar que substituiu a Administração do RCM e tinha a seu cargo a informação daquela potente estação de rádio, que cobria todo o Moçambique. Quando o assalto aconteceu estava lá dentro, a tudo tendo assistido.

Na verdade, o que então se passou na capital moçambicana foi, diz o nosso camarada de profissão, “um crime sem perdão”. Pormenoriza: “Sentindo o seu mundo de privilégios a ruir, um punhado de brancos extremistas lançou-se numa aventura sem sentido e condenada ao fracasso, arrastando emocionalmente milhares de compatriotas que, desinformados e impreparados politicamente, naquele contexto eram presa fácil de qualquer patrioteirismo rasteiro.

Num primeiro momento, os assaltantes viveram uma euforia balofa, difundido via rádio desejos e boatos como realidades – com os seus membros mais exaltados entregando-se, ao som da Rádio ocupada, a uma autêntica orgia de sangue negro nas ruelas sem esgoto do caniço.

Porém, ao terceiro dia, o medo que se havia apoderado da população negra, que ouvia a rádio apelando à intervenção sul-africana e rodesiana, transformou-se em levantamento geral sob a forma de uma marcha de catanas sobre a cidade branca”.

Isto é, lembra Ribeiro Cardoso: “O feitiço virara-se contra o feiticeiro. Chegara a hora da população branca ser tomada pelo medo, primeiro, e pelo pânico, depois. Polícia incluída, quando as suas comprometidas chefias descobriram, tarde demais, que não tinham capacidade para enfrentar muitos milhares de negros em fúria”.

Ao mesmo tempo, acrescenta, muitos daqueles brancos perceberam que tinham um pesado preço a pagar: “A fuga, o adeus doloroso a uma terra amada mas onde só aceitavam viver com as regras iníquas que sempre os favoreceram e permitiram que, de forma abjecta, vivessem à custa da exploração do negro”.

Fugiram – ironia da vida! – com o peso de uma última humilhação: a cidade branca só se salvou graças à intervenção da Frelimo e de um seu militante que, à pressa, PSP e Exército fardaram e levaram aos microfones do RCM para transmitir a senha que faria parar os negros em fúria.

“A organização da Frelimo nos subúrbios de Lourenço Marques era tão forte que bastou que esse seu militante (Aurélio Lebon, que havia integrado o Exército português como Comando, quando foi recrutado localmente) dissesse repetida e sincopadamente aos microfones da Rádio: ‘Atenção, atenção, Galo Amanheceu’. A partir daí entraram em acção os militantes da Frelimo que enquadravam a multidão negra em fúria – e tudo parou” – recordou Ribeiro Cardoso.

Só que, diz o autor de “O Fim do Império”, “parecendo este um final feliz embora com muitas lágrimas, o resultado foi verdadeiramente trágico e de consequências terríveis: largas centenas de mortos negros, algumas dezenas de mortos brancos, ódios raciais à solta, medo branco à flor da pele, uma descolonização envenenada”.

Conclui Ribeiro Cardoso: “Com este haraquíri, talvez alguns dos brancos mais extremistas tenham então compreendido que nunca houve, nem podia haver, uma colonização justa – e muito menos uma descolonização perfeita. Mas poderia ter sido bem melhor do que foi se não se tivesse criminosamente lançado gasolina na fogueira”.

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