Recomendação sobre o uso de figuras de estilo por referência a nomes próprios

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas considera preocupante a vulgarização do recurso a figuras de estilo em substituição dos nomes próprios dos sujeitos das notícias.

O exemplo mais recente é a expressão “Rei dos Frangos”, por referência a José António dos Santos, arguido na Operação Cartão Vermelho e proprietário da Valouro, considerado o maior grupo agrícola português e um dos maiores da Europa, que tem nas rações e na avicultura as principais âncoras do seu negócio.

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas considera que a naturalização deste tipo de linguagem deve ser objeto de uma reflexão por parte dos jornalistas, não só porque ela pode exprimir juízos de valor e formas de conotação, pondo em causa o dever de rigor e de distanciamento profissional, como também pode por em causa o princípio deontológico de não discriminação, ou ainda a proibição de “humilhar as pessoas”. Estes casos assumem particular gravidade quando estamos perante expressões criadas e/ou vulgarizadas pelos próprios media.

Os jornalistas não devem deixar de se preocupar com o recurso a este tipo de linguagem metafórica, suscetível de refletir, na interpretação do público, tomadas de posição, e de ser interpretada como uma forma injusta de tratamento, nomeadamente quando em causa estão vários suspeitos e pessoas de estatutos sociais diferentes. Por que razão arguidos nos mesmos processos são tratados diferentemente, uns pelo seu nome e outros pela alcunha?

O direito ao bom nome reconhecido pela Constituição a qualquer cidadão deve começar logo pelo direito a ser tratado pelo seu próprio nome.

É conhecido o facto de José António dos Santos não gostar de ser denominado por “Rei dos Frangos”, uma situação que é partilhada, por razões bem distintas, por uma empresa com sede em Leiria e lojas em vários pontos do país com nome idêntico.

Esta empresa chegou mesmo a emitir, no passado dia 07 de julho, um comunicado em defesa do seu bom nome e dos direitos que tem sobre a marca comercial usada nos seus serviços e produtos.

O recurso a este tipo de figuras retóricas está longe de ser inédito nos media, em Portugal e no estrangeiro. Expressões como “o Palito”, “o Monstro” – aliás, existem vários monstros na imprensa portuguesa -, “o Sucateiro” ou “o Bibi” são apenas alguns exemplos aplicados a pessoas envolvidas noutros casos mediáticos. Não podemos esquecer ainda o seu uso no domínio político, como no caso da “geringonça” (com a traquitana e o zingarelho à espera de outras formas de coligação) ou ainda, em termos internacionais, da “dama de ferro”, só para citar alguns exemplos.

O Conselho Deontológico recomenda que os jornalistas reflitam sobre o recurso a figuras de estilo em substituição dos nomes das pessoas e de instituições, sobretudo quando em nada adiantam ou contribuem para melhorar a informação prestada ao público ou credibilizar a função social dos jornalistas. Só situações particulares poderão justificar este tipo de linguagem, que, em caso algum, devem ter origem ou serem promovidos pelos próprios jornalistas na sua missão de informar, mesmo que servindo os interesses de uma informação ligeira e os objetivos comerciais ou sensacionalistas dos media para os quais trabalham.

 

Lisboa, 30 de julho de 2021

Partilhe