Queixa contra o Pombal Jornal, por alegadas violações deontológicas

Conselho Deontológico

Queixa nº 6/Q/2022

 

Assunto

Queixa de Luís Couto dos Santos contra o Pombal Jornal, por alegadas violações deontológicas.

Queixa

  1. O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas (adiante CD) recebeu, a 26 de janeiro de 2022, uma queixa de Luís Couto dos Santos por considerar que uma notícia publicada pelo Pombal Jornal e não assinada, na sua edição de 20 de janeiro de 2022 (“AMAGO quer ser ‘agente promotor’ da desagregação das freguesias do Oeste”), “vai totalmente contra o código deontológico dos jornalistas”.
  2. O queixoso manifesta-se particularmente contra um determinado excerto da notícia: aquele em que, citando a entrevistada Beatriz Branco, se afirma que uma “proposta apresentada pela bancada Gonçalo Ramos Independentes (GRI)” foi adiada, porque a mesma estava “‘ferida de ilegalidades graves, pondo em causa o correto funcionamento de uma comissão de acompanhamento e atropelando o estado de direito e as competências próprias e exclusivas da Assembleia de Freguesia
  3. Luís Couto dos Santos entende que se trata de uma “grave acusação difamatória, sem qualquer referência a prova ou ação concreta sobre a mesma” e que o órgão de comunicação em causa, por um lado, “não mostra qualquer preocupação em explicar ao leitor em que medida seria uma ilegalidade, parecendo pretender transmitir uma realidade que é inexistente” e, por outro, “não tem qualquer preocupação em apresentar o contraditório de tão grave informação”.

Procedimentos

  1. O CD contatou, no dia 1 de fevereiro de 2022, a diretora do Pombal Jornal, enviando uma série de perguntas, nomeadamente:
    • Existiu até ao momento algum esforço por parte do Pombal Jornal em perceber que ilegalidades seriam essas? Foi procurado o contraditório para essa ou posterior notícia sobre o assunto? Em caso negativo, surgiu, ainda assim, algum desenvolvimento do assunto?
    • Este tema da possível desagregação das freguesias já foi noticiado anteriormente pelo jornal (de modo a compreender se os leitores estariam familiarizados com o tema)?
    • A notícia em causa foi feita com apenas uma fonte porque entenderam que mais não era necessário ou por outro motivo?
    • A notícia, de 20/1/22, remete para a Assembleia de Freguesia de 17/12/21, ou seja um mês antes? Porquê tanto tempo depois?
  2. A diretora do Pombal Jornal, Manuela Frias, respondeu no dia seguinte (2 de fevereiro de 2022), “depois de analisada a situação com a jornalista que tem acompanhado de perto o assunto em causa.”
  3. No texto enviado ao CD, a jornalista diz nomeadamente que “o tema da agregação/ desagregação de freguesias já foi noticiado noutras edições” e que “a notícia em causa vem no seguimento de outra, publicada na edição de 6 de janeiro, a qual dava conta da discussão e votação, em sede de Assembleia de Freguesia, de uma proposta para criação de uma comissão de acompanhamento do processo de criação, modificação e extinção de freguesias”. Fica também a saber-se que, “na altura, o Pombal Jornal, depois de várias tentativas, conseguiu falar telefonicamente com o presidente da União de Freguesias, a 3 de Janeiro de 2022, às 12h50, o qual remeteu esclarecimentos sobre o tema, por escrito, mas apenas para a edição seguinte (20 de janeiro” e que, “nesse mesmo dia 3 de janeiro de 2022, às 14h13” foi enviado “um email ao presidente da Junta a solicitar informações sobre o referido assunto”, entendendo “que o mesmo não perdia atualidade para a edição de 20 de janeiro”. A jornalista relata que: “O presidente da União de Freguesias não respondeu às nossas questões por escrito, tal como se tinha comprometido, tentámos por diversas vezes entrar em contacto telefonicamente, para obter os esclarecimentos atrás referidos, e confrontá-lo sobre as afirmações da presidente da AMAGO. Todavia, até ao fecho da edição (18 de janeiro), não foi possível obter qualquer esclarecimento/reação por parte do presidente daquela União de Freguesias.” Manuela Frias termina dizendo que: “Perante o exposto, estamos cientes de que assumimos uma conduta assente nos princípios determinados pelo Código Deontológico dos jornalistas.”
  4. A análise das respostas suscitou algumas dúvidas, que foram colocadas à diretora do Pombal Jornal, a 4 de fevereiro, nomeadamente se o jornal já tinha noticiado anteriormente as acusações que terminam a notícia sem qualquer explicação/desenvolvimento, a qual esclareceu, a 7 de fevereiro, que não. “O excerto referido foi publicado apenas na edição de 20 de janeiro, uma vez que o mesmo se refere a uma afirmação de Beatriz Branco, com quem falámos sobre o assunto apenas para essa edição”, refere a diretora, Manuela Frias.

Análise

  1. Tendo em conta os argumentos do queixoso, o ponto essencial deste caso prende-se com a inserção, na notícia de 20 de janeiro, da frase, atribuída à presidente da AMAGO (Associação de Moradores e Amigos da Guia, Ilha e Mata Mourisca), sobre o adiamento e discussão, “por unanimidade”, de uma proposta apresentada pela bancada Gonçalo Ramos Independentes (GRI), porque “a mesma estava ‘ferida de ilegalidades graves, pondo em causa o correto funcionamento de uma comissão de acompanhamento e atropelando o estado de direito e as competências próprias e exclusivas da Assembleia de Freguesia’”.
  2. A notícia em apreço não inclui contraditório (ou referência à tentativa de o procurar, que, segundo a diretora do Pombal Jornal, existiu), nem explicação/desenvolvimento das alegadas “ilegalidades graves”.
  3. O CD confirmou, no segundo contacto com o jornal, que a afirmação em causa foi pela primeira vez publicada pelo Pombal Jornal na edição de 20 de janeiro e que, portanto, os leitores souberam dessa acusação previamente?

Deliberação

  1. É possível que para os leitores do Pombal Jornal este seja um tema fácil de entender, já que, como refere a sua diretora, “já foi noticiado noutras edições”, mas ficam algumas dúvidas para quem o lê pela primeira vez:
    • A mais evidente: que ilegalidades tem a proposta;
    • Se o adiamento foi votado por unanimidade, isso significou que os deputados que a propuseram (GRI), incluindo o próprio presidente da União de Freguesias (Gonçalo Ramos, segundo consulta no site da União de Freguesias), estiveram de acordo.
  2. Dúvidas que poderiam ter sido dissipadas se o presidente da União de Freguesias tem respondido aos diversos pedidos de esclarecimento feitas pelo Pombal Jornal e que o jornal deveria ter identificado na peça do dia 20 de janeiro, por respeito à verdade e ao exercício do contraditório.
  3. Dúvidas, ainda, que poderiam ter sido atenuadas se a notícia em causa tivesse, de alguma forma, desenvolvido a acusação feita por Beatriz Branco, sobretudo por se tratar de “ilegalidades graves (…) atropelando o estado de direito e as competências próprias e exclusivas da Assembleia de Freguesia”. O CD entende que, neste aspeto, houve desvalorização editorial de um elemento noticioso altamente relevante naquele contexto noticioso.
  4. Neste sentido, o CD concorda com o queixoso quando este afirma que a notícia publicada “não mostra qualquer preocupação em explicar ao leitor em que medida seria uma ilegalidade” (o que deveria ter sido feito junto da presidente da AMAGO) e que, em face das opções editoriais já identificadas, “não tem qualquer preocupação em apresentar o contraditório de tão grave informação” (sendo que, neste caso, insiste-se, teria sido importante identificar os esforços junto do presidente da União de Freguesias).
  5. O CD recomenda ao Pombal Jornal:
    • a) que tome como regra a identificação dos esforços realizados no sentido de obter contraditório das notícias que tal o exigem;
    • b) não deixe de desenvolver e contextualizar os temas que precisam de mais atenção, sobretudo quando são tratados continuadamente em diferentes edições;

Lisboa, 15 de fevereiro de 2022

O Conselho Deontológico

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