Publicidade «Made in» Benetton

Em «A Publicidade da Benetton – Um Discurso sobre o Real» (ed. Minerva, Coimbra, 2001), Jorge Veríssimo analisa o método através do qual a empresa Benetton se promove, utilizando a publicidade não como espaço de alienação e fantasia, mas de crítica, reflexão e apelo à resolução de problemas que fazem parte do quotidiano. Recensão crítica de Carla Rodrigues Cardoso

O sucesso da marca de confecção italiana Benetton passa, há mais de uma década, por campanhas de publicidade polémicas. Jorge Veríssimo, em «A Publicidade da Benetton», analisa 40 das imagens mais famosas, divulgadas entre 1984 e 1998, e descobre que o segredo dos excelentes resultados alcançados pela empresa reside na aposta em discursar sobre a actualidade mediática.

Ao longo dos anos, a dupla constituída pelo empresário Luciano Benetton e o fotógrafo Oliviero Toscani tem trabalhado as problemáticas que alimentam a discussão de um espaço público cada vez mais condicionado pelos média, transformando-as nos objectos preferidos das suas campanhas. Esta intimidade entre o noticiado e o publicitado alcançada pela Benetton fica demonstrada pela metodologia escolhida por Jorge Veríssimo, docente na Escola Superior de Comunicação Social. O autor acompanha toda a análise imagética dos anúncios publicitários com excertos de notícias extraídas dos cadernos internacionais dos jornais Diário de Notícias e Expresso. O resultado é uma consonância absoluta entre os dois discursos.

Em termos teóricos, Jorge Veríssmo recorre a autores tão diversos como Jacques Aumont, Roland Barthes, A. J. Greimas, Umberto Eco e Martine Joly para desconstruir a aparente simplicidade das imagens Benetton. Socorre-se, também, da retórica da imagem publicitária tal como foi definida por Jacques Durant para compreender as relações entre os elementos que surgem nas campanhas publicitárias analisadas.

A investigação permite a identificação de temas recorrentes na publicidade «made in» United Colours of Benetton. O racismo e a xenofobia são dois dos problemas mais denunciados pelas imagens analisadas. Ao reunir os anúncios classificáveis como «Campanhas Anti-Racista e Anti-Xenofobia» Jorge Veríssimo descobre que quase metade do «corpus» analisado (18 imagens) tem por base esta temática dupla. Dentro desta classificação destaca-se pela originalidade o anúncio intitulado «Hearts», de 1997, que representa três corações humanos alinhados, cada um com a sua legenda inscrita: «WHITE», «BLACK» e «YELLOW».

Jorge Veríssimo identifica de seguida o tema «Campanhas da Paz». Nesta categoria surgem oito imagens que criticam desde a Guerra Fria à Guerra do Golfo e da Jugoslávia, passando pela ditadura de Pinochet e pelo êxodo dos albaneses. Nesta vertente identifica-se uma forma muito peculiar de fazer publicidade que a aproxima ainda mais de um verdadeiro discurso sobre o real — a utilização de fotografias verdadeiras, algumas das quais já publicadas em meios de comunicação social prestigiados.

Esta tendência surge também na terceira e última grande temática que tal como a anterior reúne oito imagens sob a designação «Campanhas de Desmistificação e Prevenção da Sida». Entre as imagens criadas de raiz, surge a célebre «La Pietà» lançada na campanha Primavera/Verão de 1992. A fotografia de um jovem vítima de sida agonizando na companhia da família caiu como uma bomba nas páginas da imprensa internacional e chocou pessoas um pouco por todo o mundo. Desta vez não se tratava de uma produção de estúdio, mas de uma imagem real, captada por um fotógrafo da famosa revista Life e publicada em Novembro de 1990, numa reportagem sobre a síndrome de imunodeficiência adquirida. Neste caso, foi a própria condição de realidade que tornou esta «imagem Benetton» uma das mais polémicas de sempre.

As últimas seis imagens analisadas dividem-se pelas denúncias da Mafia siciliana e dos desastres ambientais. O objectivo continua a ser o mesmo — conquistar notoriedade para a marca Benetton, fazendo eco dos fantasmas que assombram o espaço público actual. Sem utopias, Jorge Veríssimo desmonta, passo a passo, a estratégia publicitária da Benetton. Surge, assim, um método com objectivos comerciais explícitos, através do qual a empresa se promove utilizando a publicidade não como espaço de alienação e fantasia, mas de crítica, reflexão e apelo à resolução de problemas que fazem parte do quotidiano.

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