Presidente do SJ alerta para degradação das condições de trabalho

“Para além dos conflitos armados e suas consequências na vida dos profissionais de Informação, as organizações de classe, como o Sindicato dos Jornalistas, denunciam com a maior preocupação a progressiva degradação das condições de exercício da profissão e o recuo dos direitos da liberdade de informação”. As palavras são de Alfredo Maia, presidente do SJ, na saudação apresentada a 3 de Maio ao X Congresso da Imprensa Portuguesa, em Porto Seguro, Brasil.

Na sua intervenção, o presidente do SJ sublinhou o espírito de diálogo e cooperação que caracteriza as relações do Sindicato com a Associação da Imprensa Não Diária/Associação Portuguesa de Imprensa, apesar dos pontos de vista diferentes, e manifestou a sua convicção de que “não há problema que não possa ser resolvido pela via do diálogo e do entendimento entre as partes”.

“Se formos capazes de continuar a trabalhar em conjunto na prevenção e resolução de conflitos, daremos uma contribuição decisiva para que a informação que produzimos e distribuímos seja realizada em condições de mais liberdade e de mais responsabilidade perante os públicos que servimos”, enfatizou Alfredo Maia.

O presidente do SJ anunciou ainda para breve “novas iniciativas no sentido da auto-regulação dos média, em ordem a satisfazer os deveres do sector para com a sociedade”, sublinhando que se trata de uma matéria em que o Sindicato dos Jornalistas está profundamente empenhado e em relação à qual crê “não ser possível alcançar plataformas credíveis sem o estabelecimento de compromissos entre todos os agentes do sector”.

É o seguinte o texto, na íntegra, da intervenção do presidente do SJ:

Dia Mundial da Liberdade de Imprensa 2004

Saudação no X Congresso da Imprensa Portuguesa

Começo por agradecer o convite com que o senhor Presidente da AIND-Associação Portuguesa de Imprensa me honrou.

Além de uma distinção pessoal, o convite encerra um importante significado, pontuando um percurso de diálogo e de cooperação que o SJ e a AIND-API vêm fazendo, no respeito leal pela autonomia de cada uma das nossas organizações.

Sem embargo de pontos de vista diferentes, atenta desde logo a natureza e os objectivos que ambos prosseguem, parece-nos claro que os valores da liberdade de imprensa e de uma informação mais qualificada e mais credível constituem traços essenciais de um combate comum, que nos une e que anima as nossas tarefas.

Sempre que assinalam uma data importante para a sua profissão, os jornalistas não esquecem aqueles que, de entre si, têm tombado ou sofrido no cumprimento da sua missão profissional de escutar o pulsar do Mundo, de testemunhar o andamento ou os retrocessos da História, de procurar compreender as tensões e explicar os percursos e as evoluções. Hoje, 3 de Maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, os jornalistas evocam especialmente os seus camaradas que arriscam a integridade física em cenários de conflito e os que neles pereceram.

Só no Iraque, a Federação Internacional de Jornalistas indica 40 mortos como forma de tributo pelo direito dos povos a conhecer a situação no terreno e a procurar compreender as suas razões e as perspectivas para o futuro.

As guerras e os conflitos de toda a ordem continuam a ceifar inúmeras vidas e a mutilar o futuro de milhares de seres humanos. É hora de reflectir sobre os contributos decisivos para a paz e para a concórdia entre os povos, assim como para o estabelecimento de uma ordem internacional mais justa, que podem ser dados pelos jornalistas.

Com efeito, o que reclama hoje mais atenção por parte dos representantes dos jornalistas e das empresas para os quais estes trabalham não é apenas o grave problema da insegurança e dos riscos inerentes às situações de conflito e de violência que estes são convocados a cobrir, o qual aconselha um redobrado esforço comum na formação dos profissionais deslocados para cenários de guerra.

Há que desenvolver igualmente iniciativas e acções continuadas na capacitação dos jornalistas para melhor compreenderem os contextos extraordinariamente complexos em que tais conflitos eclodem, as raízes profundas que transportam a seiva das suas causas e, sobretudo, que soluções pode a Humanidade construir colectivamente.

Numa altura em que muitos jovens jornalistas e candidatos a jornalistas acalentam o sonho de se tornarem repórteres de guerra e em que o tema da violência, do terrorismo e do conflito domina a agenda das empresas jornalísticas, seria bom que alimentássemos com empenho construtivo a ideia de um jornalismo de paz, voltado para o progresso e o bem-estar dos povos.

Tal desiderato exige jornalistas mais preparados e a aposta decisiva das empresas na qualificação dos seus recursos. Na revisão do Contrato Colectivo de Trabalho que recentemente o SJ e a AIND-API celebraram, foram dados novos passos no sentido da valorização da formação contínua dos jornalistas ao longo de toda a sua carreira.

Tendo nós responsabilidades partilhadas no Cenjor-Centro Protocolar de Formação profissional para Jornalistas, temos igualmente a responsabilidade de tornar mais conseqüente uma aposta na capacitação profissional e na contribuição para um desempenho mais qualificado e mais produtivo das nossas empresas.

Para além dos conflitos armados e suas consequências na vida dos profissionais de Informação, as organizações de classe, como o Sindicato dos Jornalistas, denunciam com a maior preocupação a progressiva degradação das condições de exercício da profissão e o recuo dos direitos da liberdade de informação que fizeram a história da revolução democrática, cujo 30.º aniversário estamos comemorando.

Desregulação das relações de trabalho, traduzida no desrespeito pelas regras estabelecidas nas leis e nos regulamentos colectivos de trabalho e numa enorme precariedade dos vínculos; concentração da propriedade dos meios de informação; exploração do trabalho de estudantes; excessiva dependência da estabilidade do emprego de factores e práticas que deveriam permanecer estranhos à cultura do sector; bem como a imposição de jornadas de trabalho intensas e prolongadas, muitas vezes sem a devida compensação – eis alguns dos traços essenciais que caracterizam a situação dos jornalistas em Portugal e noutros países.

Tais condições representam constrangimentos muito sérios à liberdade de imprensa e à liberdade de emprego, que não podem deixar de preocupar os poderes públicos e os próprios cidadãos. Por conseguinte, ao assinalar o Dia da Liberdade de Imprensa, o Sindicato dos Jornalistas coloca uma vez mais na ordem do dia a sua justa reivindicação de melhores condições de trabalho para os jornalistas e de respeito pelos seus direitos e garantias, como condição essencial para o exercício livre e eticamente responsável da profissão.

Ao dirigir-vos esta mensagem alusiva ao Dia da Liberdade de Imprensa, e estando ciente da qualidade de empresários, gestores e outros responsáveis de empresas jornalísticas, quero igualmente deixar-vos o meu testemunho de que o Sindicato dos Jornalistas tem encontrado na Associação Portuguesa de Imprensa – assim como na Associação Portuguesa de Radiodifusão, que aproveito para saudar – especialmente nos seus principais dirigentes, parceiros de negociação leal e empenhada.

De facto, tendo ideias e objectivos muito claros quanto à recuperação de direitos e à consolidação de garantias, e tendo também firmes propósitos relativamente a novas conquistas, mas conhecendo as condições no terreno, as dificuldades e constrangimentos de vária ordem, o SJ mantém uma atitude de permanente disponibilidade para o diálogo na identificação dos problemas e na sua resolução partilhada.

Exemplo desta atitude é o processo de auto-regulação das condições de trabalho em inúmeras empresas, recentemente encetado sob o patrocínio do senhor Inspector Geral do Trabalho, com a participação do nosso Sindicato, das associações patronais e das principais empresas jornalísticas não filiadas em nenhuma associação deste tipo.

Temos a firme convicção de que não há problema que não possa ser resolvido pela via do diálogo e do entendimento entre as partes. Se formos capazes de continuar a trabalhar em conjunto na prevenção e resolução de conflitos, daremos uma contribuição decisiva para que a informação que produzimos e distribuímos seja realizada em condições de mais liberdade e de mais responsabilidade perante os públicos que servimos.

Haveremos, em breve, de desenvolver novas iniciativas no sentido da auto-regulação dos média, em ordem a satisfazer os deveres do sector para com a sociedade. Trata-se de uma matéria em que estamos profundamente empenhados e em relação à qual cremos não ser possível alcançar plataformas credíveis sem o estabelecimento de compromissos entre todos os agentes do sector. Mais uma vez, aqui vos deixo o testemunho da nossas disponibilidade para esse desígnio.

Com as dificuldades próprias da natureza de cada uma das nossas organizações, vamos prosseguindo o caminho. Temo-lo percorrido juntos nalgumas etapas, como o estamos fazendo neste momento. Por vezes seguimos atalhos diferentes, procurando alcançar metas talvez diversas, mas que visam seguramente o objectivo comum de uma informação de mais qualidade, mais responsável e mais livre.

Não sei se cumpriremos o sonho de chegar ao fim de uma jornada tão longa quanto exigente, mas estou certo de que, de meta em meta, seremos capazes de remover os escolhos que tolhem os nossos passos. Como dizia o poeta, o caminho faz-se caminhando.

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