Pacto entre PS e PSD limita exercício do jornalismo

O “pacto de regime” para a reforma da Justiça subscrito pelo PS e pelo PSD levanta sérias reservas e preocupações ao Sindicato dos Jornalistas (SJ), que considera o referido acordo lesivo do exercício livre do jornalismo, nomeadamente quanto à capacidade de escrutinar a própria Justiça.

Em comunicado divulgado hoje, 15 de Setembro, o SJ faz notar que a formulação adoptada pelos dois partidos quanto ao segredo de justiça alarga o respectivo âmbito ao vincular de “igual modo quer aqueles que tenham contacto directo com o processo quer aqueles que a qualquer título tenham conhecimento de elementos que dele constem”.

Esta formulação, segundo o SJ, “representa uma machadada mortal no avanço que constituía a proposta de redacção para o artigo 371.º do Código Penal apresentada pela Unidade de Missão para a revisão das leis penais, presidida pelo Professor Rui Pereira”, a qual clarificava as circunstâncias geradoras de responsabilidade dos jornalistas nesta matéria, atribuindo apenas a responsabilidade penal a quem, “tendo tomado conhecimento de acto ou elemento” processual, “dele der conhecimento, no todo ou em parte, prejudicando a investigação criminal”.

O SJ desafia todos os grupos parlamentares a “não ficarem reféns de um pacto que inviabiliza progressos vitais para o exercício livre e responsável do jornalismo”, e reserva para momento oportuno a sua posição sobre “outros aspectos da revisão do Código Penal e do Código de Processo Penal, com consequências para o trabalho dos jornalistas”.

É o seguinte, na íntegra, o texto do comunicado do SJ:

O Sindicato dos Jornalistas e o “Pacto da Justiça”

1. O Partido Socialista e o Partido Social Democrata assinaram, no passado dia 8, um “pacto de regime” para a reforma da Justiça que levanta sérias reservas e preocupações ao Sindicato dos Jornalistas, no que diz respeito às consequências que trará para o exercício livre do Jornalismo, nomeadamente quanto à capacidade de escrutinar a própria Justiça.

2. Com efeito, ao acordarem entre si o procedimento comum quanto ao segredo de justiça – matéria reconhecidamente sensível, é certo, mas que convém encarar com desassombro e coragem – o PS e o PSD fixaram uma baliza nos seguintes termos:

“A violação do segredo de justiça constitui crime, e o respeito pela sua aplicação vincula de igual modo quer aqueles que tenham contacto directo com o processo quer aqueles que a qualquer título (sublinhado nosso) tenham conhecimento de elementos que dele constem”.

3. Esta formulação alarga o âmbito do segredo de justiça previsto no Código de Processo Penal em vigor e, sobretudo, representa uma machadada mortal no avanço que constituía a proposta de redacção para o artigo 371.º do Código Penal apresentada pela Unidade de Missão para a revisão das leis penais, presidida pelo Professor Rui Pereira, a qual pretendia clarificar de forma taxativa as circunstâncias geradoras de responsabilidade dos jornalistas nesta matéria.

4. De facto, a redacção proposta por aquela Unidade de Missão para a citada disposição apenas atribui a responsabilidade penal a quem, “tendo tomado conhecimento de acto ou elemento” processual, “dele der conhecimento, no todo ou em parte, prejudicando a investigação criminal”, definindo claramente que só “prejudica a investigação criminal quem divulgar:

a) Meio de obtenção de prova projectado ou em curso ou meio de prova a produzir;

b) A aplicação de medida de coacção ou de garantia patrimonial cuja execução ainda não tiver sido iniciada;

c) A identidade de testemunha sob protecção ou de agente encoberto.”

5. Os termos do acordo e até os discursos oficiais não deixam dúvidas de que os meios de informação e os jornalistas são vítimas preferenciais deste recuo (o líder parlamentar do PSD fez questão de explicitá-lo, na sua intervenção no acto de assinatura do “pacto”).

6. Por outro lado, confirma-se o receio expresso em várias ocasiões pelo SJ de que a redacção para o Art.º 371.º do CP proposta pela Unidade de Missão para a revisão das leis penais, mesmo sendo acolhida pelo ministro da Justiça, poderia não vencer no “jogo” parlamentar, como parece estar a acontecer.

7. Perante os termos do documento, e tendo em conta a expectativa criada com os trabalhos da Unidade de Missão para a revisão das leis penais, o SJ desafia todos os grupos parlamentares – incluindo o PS e o PSD – a não deixarem retroceder o avanço histórico que a proposta da referida Unidade representa quanto à amplitude da violação do segredo de justiça (Art.º 371.º do CP) e a não ficarem reféns de um pacto que inviabiliza progressos vitais para o exercício livre e responsável do jornalismo.

8. O SJ pronunciar-se-á oportunamente sobre outros aspectos da revisão do Código Penal e do Código de Processo Penal, com consequências para o trabalho dos jornalistas, incluindo os relacionados com a protecção do sigilo profissional.

Lisboa, 15 de Setembro de 2006

A Direcção

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