Nota sobre a relação dos jornalistas com o segredo de justiça

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas nota que “é preciso encontrar a justa medida de convivência” entre o direito de informar e o segredo de justiça.

Como cidadãos, os jornalistas estão vinculados às leis. No entanto, na sua condição de jornalistas, prosseguindo o direito fundamental e constitucionalizado de informar, poderão encontrar momentos de colisão desse seu direito com o dever de respeitar o segredo de justiça.

É preciso encontrar a justa medida de convivência destes valores: o direito de informar e o segredo de justiça. Assim, importa perceber quais as finalidades do segredo de justiça. Basicamente, são duas: proteger a investigação judicial e garantir o respeito pela presunção de inocência do investigado.

Nestes termos, é fácil perceber que um jornalista, com a sua pesquisa, não deve prejudicar a investigação judicial. Por exemplo, na sua investigação autónoma – e sublinha-se que a investigação jornalística prima por ser autónoma, seguindo agenda traçada pelo próprio jornalista – se este se der conta de que se prepara uma diligência de busca a casa de um suspeito, naturalmente não poderá ser noticiada com antecipação tal diligência, para que o jornalista não se torne cúmplice do investigado.

Por outro lado, como se trata de uma investigação autónoma, o jornalista deve proibir-se de divulgar peças do processo que não investigou, tão-somente as recebeu de um interveniente no processo judicial. Reproduzir tais peças, sem contraprovas nem contraditório, transforma o jornalista em porta-voz: não está a ser jornalista, está a fazer propaganda de um dos lados do processo, que tem interesse em tornar pública tal “indiscrição”. Além de porta-voz, o jornalista cumpliciou-se com o seu “informador” na dissolução do que deveria proteger: a presunção de inocência. É, pois, uma dupla violação dos seus deveres éticos.

Naturalmente, se um jornalista tiver conhecimento de uma peça ou episódio do processo em segredo de justiça, não fica coarctado do direito a informar – pelo contrário, é seu dever dar público conhecimento – sempre que detecte uma irregularidade, um abuso, em suma, algo que perverta as normas de equilíbrio de armas entre acusação ou defesa. Essa é uma missão de vigilância ao serviço da cidadania a que um jornalista não pode furtar-se, sejam quais forem as ameaças do prevaricador que o deseje silenciar, usando como escudo o lado formal do segredo de justiça.

Nem cúmplice do investigado, nem dos investigadores – este deve ser o lema do jornalista digno de tal nome. Esta profissão trabalha para aumentar a liberdade dos cidadãos na formulação de juízos ponderados de valor em matérias de relevância pública – não para encobrir a delinquência, venha ela de onde vier.

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