Moção portuguesa de defesa do fotojornalismo aprovada pela Federação Europeia de Jornalistas

Uma moção apresentada pelo Sindicato dos Jornalistas (SJ), com o objetivo de defender os fotojornalistas e o fotojornalismo, foi aprovada na Assembleia Geral (AG) da Federação Europeia de Jornalistas (FEJ), que reuniu nos dias 2 e 3 de junho em Budapeste, na Hungria.

Dando seguimento a uma das moções aprovadas no 5.º Congresso dos Jornalistas, realizado em Lisboa em janeiro de 2024, o SJ apresentou esta proposta na AG da FEJ. O objetivo é dar visibilidade a uma linguagem jornalística que está a perder-se, contribuir para aumentar a consciencialização em torno dos fotojornalistas que trabalham em condições cada vez mais difíceis e melhorar a sua situação laboral.

A moção apresentada pelo SJ foi acompanhada pelos espanhóis da FAPE. Após ser apresentada em Assembleia Geral recebeu o apoio do Comité Executivo, tendo sido aprovada por unanimidade.

A moção exige que as entidades reguladoras vigilantes sejam “obrigadas a aplicar sanções que desincentivem o uso de imagens de fontes não jornalísticas” e sugere que “todos os colaboradores fotográficos possuam uma licença profissional válida, nos países onde estas são utilizadas”.

O texto recomenda “evitar, sempre que possível, o uso de imagens de organizações externas” e procura “sensibilizar os membros nas redações para monitorizar” o uso de fotografias de não jornalistas, alertando para o perigo e até dilema ético que é usar fotos e agências de comunicação, governos ou clubes, quando ninguém parece achar aceitável publicar um texto de um assessor de comunicação. Mas quando se trata de uma fotografia, infelizmente é diferente.

Na defesa das condições de trabalho e da dignificação desta atividade, a moção apresentada pelo SJ visa ainda “implementar a tabela de negociação coletiva para fotojornalistas independentes, atualizá-la tendo em conta a inflação e o aumento dos custos desde que foi negociada, e garantir a sua aplicação efetiva, aplicando multas, se necessário, às partes incumpridoras.” Atendendo ao potencial de reuso das imagens, foi proposto ainda “criar uma tabela para a republicação de imagens, a sua venda a terceiros, sob o conceito de direitos de autor.”

Entre as medidas constantes do texto da moção apresentada pelo SJ, destaque ainda para a importância de “prever compensações para reparação ou substituição de equipamento pessoal danificado durante a reportagem”, que nos parece particularmente importante em tempo de intolerância crescente com o trabalho dos jornalistas e à luz de casos e agressões recentes que nos preocupam.

O texto integral da moção:

  1. SOBRE A FOTOGRAFIA COMO A ÚNICA LINGUAGEM QUE PODE SER COMPREENDIDA EM QUALQUER PARTE DO MUNDO

Apresentado pelo Sindicato dos Jornalistas (Portugal), FAPE (Espanha)

A Assembleia Geral da Federação Europeia de Jornalistas (EFJ), reunida em Budapeste, Hungria, nos dias 2 e 3 de junho de 2025, lamenta que, embora concordemos e aplaudamos a noção de que o Fotojornalismo é simplesmente Jornalismo, a verdade é que não sentimos esse reconhecimento formal na prática. O Fotojornalismo tem características muito específicas e enfrenta problemas sérios.

A redução dos orçamentos editoriais, o aumento da concorrência e a desconfiança generalizada em relação à imprensa são apenas alguns dos fatores que afetam o futuro do fotojornalismo. Ainda assim, continuamos a assistir à eliminação completa das secções de fotografia, “forçando” os jornalistas a desempenhar múltiplas funções ou a recorrer a serviços de fotografia externos – muitas vezes com base apenas em critérios financeiros, sem considerar o valor acrescentado de uma equipa profissional ou especializada.

Numa altura em que todos os meios de comunicação utilizam fotografia em várias plataformas – seja na imprensa, rádio ou televisão (esta última incluindo frequentemente fotografias nos blocos noticiosos e, por vezes, nas próprias notícias, sem o devido crédito) – as ações de algumas direções editoriais e administrativas ao eliminarem postos de trabalho são incompreensíveis.

Por exemplo, em Portugal, embora não possamos confirmar oficialmente alguns números, acreditamos que, nos últimos 20 anos, nos órgãos de comunicação social ainda existentes, de cerca de 100 fotojornalistas efetivos, hoje restam pouco mais de 30 profissionais no ativo.

Entre estes, há publicações que, independentemente da rentabilidade, continuam com condições precárias e despedimentos, revelando claramente a falta de investimento em profissionais mais qualificados. É evidente que estas decisões não se baseiam apenas em fatores financeiros, mas sobretudo na ausência de uma linha editorial para a fotografia.

Mas há exemplos ainda piores. Veja-se o caso do jornal A Bola, que extinguiu toda a sua secção de fotografia, eliminando um dos departamentos editoriais mais antigos dos nossos jornais. Como é possível que um jornal diário desportivo, num país que dedica uma percentagem significativa da informação ao desporto, esteja presente em todas as plataformas e funcione sem fotojornalistas?

Isto leva-nos a outra questão extremamente importante: a obtenção de imagens através de agências fotográficas, nos melhores casos, ou através de agências de comunicação, gabinetes de imprensa, clubes e federações. Nenhuma destas entidades possui um código deontológico que oriente a sua atuação, o que, na nossa perspetiva, é ainda mais grave, pois compromete não só a credibilidade da publicação/meio de comunicação, como também um dos valores fundamentais do jornalismo: a imparcialidade! Seria ético publicar um texto escrito diretamente por um assessor de imprensa? Então por que razão é aceitável publicar uma fotografia enviada por essas organizações/entidades? Há muito que cobrimos comunicados de imprensa agendados como conferências de imprensa, onde não são permitidas perguntas.

Vamos prejudicar-nos ainda mais e abdicar também do controlo sobre a imagem? Sabemos que o “jornalismo de secretária” é economicamente apelativo para quem gere um jornal através de uma folha de cálculo, vendo-o como uma forma de otimizar tempo e reduzir despesas. Mas acreditam mesmo que os leitores estão dispostos a pagar por este jornalismo insípido, de copiar e colar?

Na realidade, a necessidade deste espaço informativo mantém-se; simplesmente encontram-se formas alternativas de o preencher, sendo o trabalho precário uma dessas alternativas às agências de comunicação.

Onde não existe vínculo contratual:

  • Não há obrigações para o contratante;
  • Os profissionais enfrentam más condições de trabalho;
  • Os profissionais estão sujeitos a assédio laboral;
  • Os profissionais não têm progressão na carreira;
  • Os profissionais recebem honorários miseráveis;
  • Os profissionais não têm direitos, apenas deveres.

Outra consequência deste desinvestimento nos fotojornalistas e no fotojornalismo é a banalização do uso de imagens de agências, onde a nossa preocupação reside na utilização de uma narrativa única e na consequente perda de pluralidade. É isto que procuramos quando pretendemos ser credíveis e distinguir-nos junto dos leitores?

No passado, a fotografia tinha uma personalidade distinta. Havia orgulho em ter a melhor fotografia de capa e os melhores trabalhos no interior dos jornais, apoiados por imagens que complementavam o texto ou, em alguns casos, até o superavam. Agora, a fotografia é quase anónima porque, por razões puramente económicas, está a ser homogeneizada.

Diz-se que a fotografia está em declínio e condenada, mas hoje tiram-se mais fotografias do que nunca, com milhões a serem carregadas diariamente nas redes sociais. Toda a gente tem um telemóvel, toda a gente tira fotografias, toda a gente se vê como fotógrafo, mas principalmente, e contrariando todas as leis que impedem a publicação de material de quem não tem credenciais profissionais, as direções editoriais incluem qualquer imagem de qualquer cidadão nas suas publicações, sem verificar a autenticidade dos factos, sem obrigações de um código deontológico. E isso faz uma diferença significativa para o fotojornalismo.

A tecnologia e a era digital foram um choque tremendo para o fotojornalismo. O mercado está saturado de imagens, os preços caíram, ao contrário do investimento que os fotojornalistas têm de fazer para entrar na profissão, que varia entre os 15.000 € e os 30.000 € em equipamento. Isto sem contar com as despesas diárias como deslocações, internet, seguros, impostos, entre outros custos.

O mesmo raciocínio aplica-se aos valores pagos por trabalho, com honorários ridiculamente baixos por tarefa. Como pode alguém financiar os custos de formação, equipamento, produção e logística para concorrer a um trabalho que, com muita sorte, pode render um retorno financeiro de 20.000 € por ano?

A Assembleia Geral da EFJ instrui o Comité Diretor da EFJ a promover os seguintes princípios junto dos meios de comunicação, através dos afiliados da EFJ:

  • Garantir que todos os colaboradores fotográficos possuam uma licença profissional válida, nos países onde estas são utilizadas;
  • Evitar, sempre que possível, o uso de imagens de organizações externas. O uso de imagens sem proveniência controlada (cidadãos anónimos, redes sociais, agências de comunicação, gabinetes de imprensa) deve ser excecional, não a regra. O crédito fotográfico deve ser sempre utilizado, independentemente da fonte;
  • Sensibilizar os membros nas redações para monitorizar o uso de fotografias de organizações externas, sendo as entidades reguladoras vigilantes e obrigadas a aplicar sanções que desincentivem o uso de imagens de fontes não jornalísticas;
  • Se um meio de comunicação utilizar imagens de fontes externas quando o trabalho poderia ter sido realizado por um profissional da casa ou colaborador devidamente acreditado, deve ser exigida uma explicação ao editor responsável;
  • Informar os profissionais com antecedência quando o trabalho a realizar for publirreportagem ou outra forma esquizofrénica de publicidade disfarçada;
  • Implementar a tabela de negociação coletiva para fotojornalistas independentes, atualizá-la tendo em conta a inflação e o aumento dos custos desde que foi negociada, e garantir a sua aplicação efetiva, aplicando multas, se necessário, às partes incumpridoras;
  • Criar uma tabela para a republicação de imagens, a sua venda a terceiros, sob o conceito de direitos de autor;
  • Prever compensações para reparação ou substituição de equipamento pessoal danificado durante a reportagem.
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