DN quer substituir falsos recibos verdes por contratos leoninos

Oito jornalistas do “Diário de Notícias” (DN), que durante vários anos trabalharam para o jornal numa situação de falso recibo verde, foram agora confrontados pela Empresa Global Notícias com um contrato de trabalho que não respeita os seus direitos.

O clausulado do contrato de trabalho apresentado aos oito jornalistas, que em Fevereiro último foram integrados no quadro da empresa, “não tem em conta o tempo de serviço efectivamente já prestado pelos jornalistas à Empresa e fixa regras de extrema flexibilidade quanto ao horário e local de trabalho, entre outras condições, ao arrepio das normas convencionais aplicáveis”, denuncia o Sindicato dos Jornalistas (SJ) em comunicado divulgado em 28 de Junho.

Segundo o SJ, a empresa pretende ainda “fixar um período experimental” aos profissionais em causa, bem como garantir a sua “total disponibilidade”, impondo-lhes “um contrato de exclusividade geral e absoluta sem qualquer contrapartida”.

Considerando que se está perante um contrato “inaceitável”, o SJ lembra que os trabalhadores não são obrigados a assiná-lo, tanto mais que nos termos da lei “os contratos não têm de revestir forma escrita” e que a empresa reconhece a existência da relação de trabalho.

A fim de acautelar os interesses dos jornalistas em causa, o SJ decidiu “informar as delegações de Lisboa e Porto da Inspecção Geral de Trabalho acerca da situação que lhes foi criada”, e “disponibiliza os Serviços Jurídicos do Sindicato para apoiar os associados que pretendam reclamar contenciosa ou judicialmente a respectiva antiguidade”.

É o seguinte o texto, na íntegra, do comunicado do SJ:

Falsos recibos verdes mal resolvidos no DN

1. Tendo tomado conhecimento do teor dos contratos de trabalho que a Empresa Global Notícias apresentou a oito jornalistas da redacção do “Diário de Notícias”, cuja maioria esteve vários anos numa situação de falso trabalho independente, a Direcção do Sindicato dos Jornalistas transmitiu à Administração a sua profunda discordância em relação ao respectivo clausulado.

2. O clausulado dos contratos apresentado àqueles jornalistas, que foram integrados no quadro em Fevereiro último, não tem em conta o tempo de serviço efectivamente já prestado pelos jornalistas à Empresa e fixa regras de extrema flexibilidade quanto ao horário e local de trabalho, entre outras condições, ao arrepio das normas convencionais aplicáveis.

3. Logo na atribuição da categoria profissional, o contrato emprega erradamente o termo jornalista, quando este na verdade designa a profissão e não a categoria, a qual há-de ser uma das que estão previstas no Contrato Colectivo de Trabalho aplicável, tendo em conta o tempo de serviço já prestado (incluindo o período em regime de falso trabalho independente) e o reconhecimento de mérito de cada um dos profissionais.

4. O contrato faz aplicar erradamente a mobilidade imposta pelo Código do Trabalho, quando prevê que o trabalhador desempenhe funções afins e/ou funcionalmente ligadas à actividade para que é contratado, quando isso não acontece com a profissão de jornalista.

5. A Empresa em vez de fazer retroagir a vigência do contrato à data em que cada jornalista efectivamente iniciou a sua actividade ao seu serviço, como é de elementar justiça ao fim de tantos anos de real relação de trabalho, pretende fixar um período experimental, o que é de todo inaceitável.

6. A cláusula relativa ao horário de trabalho refere que o período normal de trabalho é de sete horas diárias e de 35 semanais, repartido por cinco dias, tal como o CCT estipula mas introduz um regime de adaptabilidade que não permite cumprir o período normal nem prevê o acordo do jornalista para alterar o seu horário.

7. Os jornalistas ficariam assim na total disponibilidade da entidade empregadora, nunca sabendo a duração efectiva de trabalho diário, nem do trabalho semanal, numa situação de irregularidade de horário sem qualquer contrapartida e mais onerosa do que a que têm os restantes jornalistas.

8. A flexibilidade extrema estende-se também ao local de trabalho, já que a mesma cláusula, recolhendo o consentimento do trabalhador para qualquer alteração do local de trabalho, permite que a entidade patronal o possa deslocar para onde muito bem entenda, mesmo quando isso lhe acarrete prejuízo sério.

9. A expressão “no lugar em que a empresa tiver centrados objectivamente os seus interesses em cada momento, no âmbito das funções aqui contratadas” constante no contrato é ambígua e permite várias interpretações, pelo que o contrato deve mencionar expressamente os endereços das redacções do “Diário de Notícias” onde os jornalistas têm o seu posto de trabalho, podendo referir que estes se deslocam ao exterior quando em serviço de reportagem.

10. Os regulamentos referidos no contrato deveriam constar como anexo do mesmo ou dados a conhecer antecipadamente, pois pode acontecer que os trabalhadores nem sequer os conheçam.

11. É inaceitável que a Empresa imponha um contrato de exclusividade geral e absoluta sem qualquer contrapartida, atendendo à exiguidade do salário proposto e ao que dispõe o CCT aplicável. Uma situação que, além do mais, colide com a prática no Diário de Notícias que, há alguns anos, aboliu o regime de exclusividade.

12. Nestes termos, assiste aos jornalistas em causa o legítimo direito de não assinarem estes contratos, por violarem direitos que já lhe estão consagrados em sede convencional e por ser seu direito que a relação de trabalho seja regulada pelas normas aplicadas aos restantes jornalistas da mesma redacção.

13. Com efeito, nos termos da lei, os mesmos jornalistas não necessitam de assinar o que quer que seja, pois os contratos não têm de revestir forma escrita, tanto mais que a Empresa reconhece a existência da relação de trabalho.

14. A fim de assegurar uma maior protecção dos jornalistas em causa, o SJ vai informar as delegações de Lisboa e Porto da Inspecção Geral de Trabalho acerca da situação que lhes foi criada.

15. Ao mesmo tempo que disponibiliza os Serviços Jurídicos do Sindicato para apoiar os associados que pretendam reclamar contenciosa ou judicialmente a respectiva antiguidade, a Direcção apela à unidade dos jornalistas do DN em torno da defesa dos seus camaradas alvo de mais esta injustiça.

Lisboa, 28 de Junho de 2004

A Direcção

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